O ponto de vista

Estava mais para as migalhas do que o banquete disposto à mesa, eram nas diversidades que se davam e compunham um todo repleto de sinais invisíveis aos olhos deslumbrados com o farto.

Sempre lhe atraiu mais a timidez do quase secreto, o andar do bêbado, as conversas descontraídas de uma quarta-feira ociosa, a chuva caindo, a dança improvisada, a falta da lua, o olhar magnetizado que ignora o ritmo, perde a compostura. Um beijo pouco vale perto de um olhar. Talvez um beijo possa ser esquecido, um olhar pode intrigar por semanas seguidas, composta por segundos lerdos, nos levando para uma correnteza na qual não desejamos caminho nenhum senão o que já estamos.

Estava disposto a doar o coração sem conservar o fígado, desprevenido diante das desventuras, beberia do gosto amargo da decepção incontáveis vezes, preço pago pelo vício que nos domina depois de acertar a primeira vez.

Não se esquece o primeiro amor, paixão nos rouba e abandona em velocidades iguais, chama em vela apagada ao sopro. Amor não passa, não fica e a superação dele só se dá na comprovação de que ele não houve.

Sorria para o espelho, criava poemas de poesias com caneta de ponta fina ao som de Beirut, tinha passos rápidos, coração lento e um desejo intenso de estar em todos e em todo lugar, por vezes se encontrava recostado em um canto observando as pessoas, adivinhando pensamentos e rindo da diversidade. Desafiava-se a fazer coisas que discordaria e de pensar ao contrário do que pensaria, regalias de uma mente confusa que lhe permite brincar de erros e acertos.

Estava ali com o seu esboço todo rabiscado, folhas em branco para serem preenchidas, tinta de sangue, tinta de vida e tudo que fosse feito não poderia ser apagado, é a vida, não há tempo para passar a limpo.