NO ANIVERSÁRIO DE SÃO PAULO, OLHEMOS AOS LÍRIOS DE SAMPA!

Diz a sabedoria popular que, amor consciente, a exemplo do que deve ser exercido na condição de pais, é aquele que além de reconhecer as boas qualidade dos filhos, deve também enxergar seus erros para melhor encaminhá-los.

Penso que o olhar dos filhos quanto aos seus pais, por analogia, é o outro sentido duma mesma direção.

Quando caminhamos pela vida também reconhecemos os pontos altos e baixos da orientação que tivemos, embora o amor esteja a parte desta consciente constatação.

Aqui, no entanto, escrevo na condição de filha de Sampa, minha querida "cidade-mãe", berço do país e do mundo, a quem muito amo, e que todavia, além das belezas, do charme e das tantas comodidades duma megalópole cosmopolita, também apresenta sérios problemas.

Ainda outro dia eu via pela televisão que uma ONG fez uma pesquisa sobre o nível de satisfação dos munícipes para com São Paulo, e pelo que entendi, a classe média da cidade não está muito satisfeita.

As explicações são óbvias.

Há tempos que São Paulo cresce sem planejamento urbanístico algum, embora concentrando sua densidade demográfica de forma assustadora, e no decorrer dos anos nossos problemas foram se avolumando de tal sorte que até os próprios urbanistas, profissionais renomados e aptos para diagnosticarem nossos problemas de ocupação de solo e de infraestrutura, parecem não acreditar em algumas soluções, ou ao menos, não acreditam em soluções a curto prazo.

Fato é que a cidade parece várias cidades aglomeradas, com um contraste social gritante, assustador, aonde ilhas de muita riqueza contrastam com a pobreza disseminada, de base social crítica, abaixo da linha da miséria.

Não há necessidade de profissionais de sociologia par tal diagnóstico, basta andar e olhar a cidade com atenção.

O lixo nela se acumula de forma assustadora.

A água que nos vem dos principais mananciais dos entornos perdeu suas características físicas naturais, e passa em determinadas épocas do ano a ter odor, gosto e cor.

Os rios que cortam a cidade são rios de perfume típico, aonde o lixo que se tenta esconder sobrenada na superfície na presença da mínima chuva.

Nas épocas sazonais de chuvas torrenciais a corrente de água procura seu espaço de direito pelo solo, e por entre as montanhas de lixo, inclusive dentro dos próprios rios. Sérias inundações são uma constante.

Na zona cerealista de Sampa, aquela em que a televisão hegemônica diz com ORGULHO que é visitada por turistas internacionais, e de fato o é, nunca recebeu tantos moradores de rua que parecem mais do que negligenciados pelo poder gestor. O Lixo por ali é um convite à epidemia de dengue e de leptospirose que deverá fazer muitos casos nesse verão.

A situação por ali é caótica e vergonhosa para uma prefeitura que diz cuidar da cidade ...por ela denominada de cidade LIMPA.

Os buracos das ruas só conseguem ser vencidos por veículos de tração nas quatro rodas ou por pesados tratores.

O trânsito de caminhões pelos bairros não é fiscalizado, afunda todos os asfaltos que são remendados a toque de caixa de forma amadora.

Canso de vê-los por aí...a circular leve livres e soltos, inclusive emitindo gás preto pelos escapamentos, mesmo depois da taxa de inspecção veicular da CONTROLAR que mais parece ser um caça- níquel oficializado.

O TRÂNSITO É CAÓTICO e sem solução, porém a cada esquina um radar mal intencionado espera pelo cidadão mais desavisado.

Prefiro não comentar sobre transporte público. Eu não sairia mais daqui...

As pouquíssimas árvores da cidade, que deveriam ser sinônimo de boa preservação da ecologia, matam mais que o trânsito, a droga e a violência, principalmente quando as chuvas não lhes dão trégua.

Nossos parques públicos estão abandonados, quando não entregues às terceirizações que exploram os cidadãos que já pagam muito pelo que não têm. parques públicos com taxas de estacionamentos exorbitantes...

Porque...nossos IPTUs são dos mais altos do mundo!

Eu pergunto ao nosso prefeito Kassab: pagamos pelo quê, afinal?

São Paulo faz quatrocentos e cinquenta e sete anos, e acredito ser nosso aniversário uma boa oportunidade para repensar nossa situação.

Amanhã provavelmente o povo estará nos parques, nos shows megalomaníacos que todo governo sempre nos oferece.

Muito bem, a história é sempre a mesma. Peço a Deus para segurar suas águas bem lá em cima...

Por outro lado, nós, a bela São Paulo, tão cantada e decantada nos versos de Caetano temos o tudo de bom! Temos o calor humano!

Uma cultura impecável: teatros, cinemas, museus, shows, livrarias, shoppings, hotéis, escolas, universidades, serviços diversos, e até a gastronomia internacional...quiçá o maior polo de gastronomia do planeta, o tudo que nos coloca em pé de igualdade com as megalópoles do primeiro mundo. É uma parte da vitória, sem dúvida o é.

Mas nos falta cidadania.

Aquela mesma que falta ao país inteiro, para que acordemos a exigir que se cumpra o compromisso de se cuidar HONESTAMENTE da cidade.

Sem cidadania não haverá futuro e sequer qualidade para as próximas gerações de Sampa, posto que está deveras difícil a qualidade de vida por aqui, com ou sem condição financeira.

A São Paulo, na qualidade de paulistana que a ama, meus sinceros parabéns por resistir ao tudo, comemorar e ainda acreditar em melhores dias.

*Senão, seria como construir arranhacéus sem almas para habitá-los.

NOTA* citação de Érico Veríssimo em "OLHAI OS LÍRIOS DO CAMPO".