INTERNET. O COMPLEXO É HUMANO.

O psicanalista francês Charles Melman, 76 anos, íntimo colaborador de Lacan, afirma do alto de seu empirismo:

“O mundo virtual proporcionado pela internet faz sucesso por se tratar de um mundo lúdico”. Lúdico significa jogo, brinquedo, atividade destinada a esse objetivo, sem seriedade.

Por isso, acrescenta Melman, “ali qualquer um pode viver uma série de vidas sucessivas sem nenhum compromisso definitivo.”

E se infere o pior, como destaca o renomado observador da realidade contemporânea, à luz do computador: “As pessoas querem se distanciar da realidade porque ela implica sempre um limite.”

Esse o grande impasse, que traz sofrimento, o limite é imposto pelas faculdades e dons. Quando esses traços sofrem com as traves da inteligência, evidentemente circunscrita a pequeno perímetro, com núcleo gravitacional de restritas dimensões, incide-se em estado falacioso de projetar o que queríamos ser e não conseguimos na vida real.

Isto é humano, faz parte das intrincadas oficinas da mente cujo motor é múltiplo em fazer ou não estragos. É preciso gritar ao mundo que estamos nele e precisamos atenção destacada.

É o famoso complexo que se abate sobre a personalidade doentia que vai cambaleante vestindo as roupagens que não encontrou no armário da sociedade, na existência real, onde a realidade barra os passos da egolatria por suas próprias características anãs, sopradas por todos os ventos negativos, da vaidade à pretensão, ambas tolas e infantis, escancaradamente pueris ainda que habitem carcassas que já deveriam ser maduras.

Assim vai-se do nada que se é ao tudo que se pensa ser. Há um esmagamento do ser que vira uma hipótese, que em lógica, ciência que a tudo comanda, é aquilo que não é, que seria, se fosse.

Essa hipótese salta aos olhos de quem é arguto observador, e a hipótese vira evidência, que em lógica mostra e encerra, sem tergiversações, a certeza.

Falta uma identidade, um objetivo mais ou menos claro na vida, ao passo que esses exercícios virtuais não pressupõem nenhuma identidade e por isso são desenvolvidos com sofreguidão e gigantismo nessa patologia que pode e deve ser tratada.

Somos o que somos e disso não escaparemos. Se nada somos, só conjecturas, a internet pode esconder e propalar o que queríamos ser, e passamos a Don Quixotes do nada.

Não há melhor veículo contemporâneo que o computador para esses doentes do ego mostrarem suas sequelas avessas ao mundo real, não havendo compensação para suas frustrações. Isto não abranda os sofrimentos, lança os doentes, mais ainda, no abismo de suas depressões existencias e conseqüentes dependências, todas.

Devemos ajudá-los e apontar a integridade deles para com eles mesmos como meta, o que faria primor no diálogo com a consciência, como Sócrates no exercício maiêutico.

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 22/01/2011
Código do texto: T2745198
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