Coisas que observo através da janela do ônibus.
Os mendigos descansam sob a prosperidade e meus olhos envergonhados não conseguem encarar a miséria, enquanto isso todo brilho das noites se apaga e só as manhas importam, elas tomam pequenas formas de esperança como se vivessem dentro de um imenso congelador, ate que em uma noite dessas que passamos sem notar as ondas tranqüilizadoras que se formam na escuridão de um céu pesado prestes a desabar, dissolvemos esses pequenos blocos de gelo em um copo qualquer. Nada melhor que a mente adormecida para reconhecer suas próprias lembranças. Em toda vila sempre tem bêbado caído na esquina, como de fizesse parte do ambiente, praticamente um fator cultural de uma cultura urbana construída através da dor e do descontentamento, onde todos os atos padecem com uma solidariedade curta e passageira assim como o lugar ao meu lado que psiquicamente através de uma forca liberada por um olhar incomodo ou pela energia subjetiva de meu ser e deixado vazio no primeiro minuto de descanso de uma desconhecida qualquer. Pelo caminho devastado se proliferam as lojas de automóveis, os semáforos e postos de gasolina, na noite brilham através dos olhos vazios os bares, os puteiros e as biqueiras, o consumismo desenfreado se espalha consumindo a própria existência e o inferno superpovoado explode em arrependimento espalhando sonhos em pequenos pedaços nos quintais infernais dos homens que foram heróis um dia. Estamos livremente encarcerados, pois hoje não existe espaço coletivo, toda propriedade esta demarcada ou e do homem ou do estado e tudo que podemos fazer e interagir com o tempo, brincar com os limites dos outros e figurar o mundo através de passos solitários. Do meu passado sopra um vento que congela os meus cabelos e os pensamentos refugiados na imaginação de uma criança edificam possibilidades que se perder no presente. Os olhos da inveja percorrem um objeto e a desatenção mutila o próprio corpo enquanto o reflexo meio apagado que habita os vidros como um fantasma se perde em meio à pobreza que decora as calcadas da periferia. Caminho como um vigia noturno que guarda o mar que mata nossa sede, displicentes da importância de ser e totalmente ausente do momento de estar sendo levado pelo ócio das madrugadas através de uma névoa fria que surge por entre os ciprestes de um pensamento morto. Olhos que observam com gula e melancolia retratam no vazio de um corpo cansado pelas horas que passam entediantes em um matrimonio cômodo e brochante. Os decotes saltam nas noites quentes de verão e as mulheres ostentam cigarros como um pênis onde cada baforada lançada ao ar parecem um turbilhão de vidas que não encontram abrigo no suco gástrico misturado a cerveja e vontade. O brilho intenso da modernidade ofusca meus olhos, ele se mistura com minhas lagrimas e transformam meu sorriso em sol infinitamente cintilante e frio. Mutilo meus pensamentos em pequenos pedaços que procuram sobreviver em todos os lugares vazios que meus pequenos olhos podem encontrar e percebo na fria percepção da realidade que todos eles voltam assustados procurando abrigo no único lugar em que pacificamente perturbados apenas por uma neurose singular eles podem repousar. Estou sozinho com meus olhos voltados para o nada em uma noite triste como eu enquanto a lua tenta dissipar a minha escuridão e iluminar a dolorosa cidade de pedra, que sangra através de olhares que hoje já não reconheço.