Dia de alegria. Dia de cão. Dia que conversei com Deus.

Dia de alegria. Dia de cão. Dia que conversei com Deus.

O sol batia na minha gaiolinha. A médica veterinária acabara de tirar as ataduras da minha patinha da frente, a da direita. Não estava mais quebrada.

Com um sorriso pediu para eu tomar cuidado ao atravessar as ruas. Que desta vez tivera tido muita sorte. Mais sorte ainda por ter sido socorrido imediatamente pela motorista que ficou consternada com o atropelamento.

Passou a mão em minha cabeça, foi então que senti a minha orelha dolorida.

Ao sair me liberou para brincar no pátio com os novos amiguinhos.

Comecei a andar todo dolorido, com as articulações endurecidas.

Tinha que andar, correr. A vida havia de continuar.

Caminhei até o final do pátio onde ouvi que era domingo, dia de visitas.

Aos domingos a menininha me banhava, perfumava meus pelos e saíamos a passear.

Corríamos saltitantes cheios de felicidade.

A calçada, a rua, a praça, o mundo, eram nossos.

Uma lágrima correu pelo meu focinho.

Nós não temos memória para ódio e contrariedades, mas sentimos saudades.

Outra lágrima e outra mais correram.

Deitei no chão, com as patinhas para frente, encostei o focinho sobre elas e ali fiquei pensando na menininha, que também devia estar sofrendo com a minha ausência.

No meu silêncio conversei com Deus, falamos sobre o nosso céu, meus amiguinhos que estão lá e a minha quase ida para o nosso paraíso.

Deus que ali estava me abençoou. Contou-me que ama muito os animais, todos sem distinção e foi ter com os outros animaizinhos.

Alguém falou meu nome.

Escutei meu nome, ao longe, mas escutei. Só existia um Tuxo. Meu nome era único. Eu creio.

Virei rápido, tão rápido que doeu meu pescoço.

Não havia ninguém só o vulto de Deus passando pela parede indo para o pátio ao lado.

A presença de Deus sempre é muito importante, mas Ele sabia quem eu queria ver naquele momento.

O portão de ferro estava fechado.

Voltei a minha posição, aquela com o focinho sobre as patas. Posição de oração, de falar com Deus, com os anjos, com os amiguinhos que já se foram, pedir proteção para nossos donos e desfazer as maldades que alguns querem por inveja transmitir-lhes. Deus nos deu o poder, de reter as maldades endereçadas aos nossos donos.

O portão de ferro rangeu ao abrir.

Um homem mandou que procurasse ali no meio daquela imensidão de cães.

Escutei meu nome. Tuxo. Tuxo. Tuxo.

Olhei.

Levantei, esqueci as dores, corri era a menininha. Pulei em seus braços, me abraçou, encostei meu focinho em seu peito, escutei aquele coraçãozinho, ela chorou, eu chorei.

Entre lágrimas ela repetiu meu nome varias vezes. Lambi seu rosto, não queria parar mais, senti o gosto do paraíso naquele momento, que queria fosse eterno.

A menininha começou a gritar para sua mãe que havia me encontrado.

Ela veio ter conosco, colocou a mão próxima ao meu focinho e em agradecimento comecei a lambê-la.

Fomos para a casa.

Antonio Fernando Ribeiro
Enviado por Antonio Fernando Ribeiro em 20/01/2011
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