A injustiça de um bordão
Na década de 60, pequenas cidades do interior tinham seu comércio girando ao redor de uma grande casa comercial; os empórios que vendiam de tudo, desde o sapato até o chapéu, o lenço daquela que colhia nas fazendas ou das madames que freqüentavam a missa das 19h; a pinga e o vinho fino ocupavam as prateleiras do velho armazém; o sal temperava o gostoso tutu e o açúcar tornava mais doce o sorriso das meninas.
A esposa do comerciante sempre permitia que suas comadres, das áreas rurais, que circundavam a cidade, mandassem suas filhas para que estudassem na única escola da região. Vinham as cunhãs , e prestavam serviços domésticos, tornavam-se agregadas, exatamente como na antiga Roma.
O banheiro das estudantes/serviçais era no fundo da casa, que dava para um enorme quintal, onde se criavam galinhas e plantava-se laranja lima. O quintal era quase que comunitário entre os familiares; netos e sobrinhos usavam a área em suas brincadeiras, e até em brincadeiras típicas de adolescentes, que adoravam ver meninas tomando banho.
O nome Darcy sempre soou como nome de anjo, ou seja, sem sexo definido, mas aquela Darcy, que veio para estudar e encontrou alojamento na casa do grande comerciante local, era muito mulher, um corpo monumental e em cores libidinosas, pecaminosas e alucinógenas, entenda-se, quase negra.
A Darcy tomava banho como se estivesse em um palco, e o furo na parede, engenhosamente, e sem pudor, ali colocado por mim, permitia à platéia solitária, eu no caso, assistir, com literal prazer, aquela cena, misto de realidade, por parte dela, e fantasia do assistente.
Todos os uivos lascivos, que naturalmente seriam provocados por aquela imagem, eu os sufocava, o silêncio era o preço da ação condenável; e mesmo em silêncio absoluto, ao olhar para trás vi minha avó com o rabo-de-tatu nas mãos... e o prazer deu lugar à angústia.
Acho que já conheço a resposta, mas se TODA A NUDEZ SERÁ CASTIGADA, a Darcy revelava sua nudez, por que eu, fiel apreciador da beleza....fui castigado?