Verdejantes lamacentas
Eu vejo algum brilho nos olhos de poucos. Estes tão poucos, sôfregos, parecem muitos e tantos e vastos. Parecem até espalhados. Carregam um brilho que perpassa, transgride, contagia. Um brilho que catapulta sementes, fazendo destes, poucos, pensadores do todo, de um tudo.
Vejo pureza nos olhos de alguns. Uma pureza límpida, verdejante, incolor. Não uma pureza inocente, burra. Vejo uma pureza voraz, cheia de riquezas.
Vejo também dor. Viver dói. As armadilhas diárias, nefastas, nos pregam vicissitudes desanimadoras, cruéis. Tão anjos que somos, que nem asas temos. Não sabemos voar, nem pregar, nem ensinar, nem impor. Sabemos rosnar!
Viver é um árduo processo contínuo de “so-bre-viver”. Vai-se sobrevivendo em coletivos, bandos, caminhando em chão lamacento, tão disperso quanto soberano, tão profundo quanto superficial, tão antagônico. Vamos semeando pedras, cultivando espinhos, regando marionetes, colhendo pacíficos. Urge a ânsia do protagonismo, do ativismo, da luta, do diálogo, do pensar, do anarquismo. Urge também a voracidade do tempo, engolidor, que de tão engessados que estamos/somos, vamos perpetuando um nada, um faz de conta juvenil, amador, sob picadeiros bamboleantes, de um processo vital. Como eu disse, viver dói. E ninguém está aqui para não sentir dor, estar-se-á para viver, para sentir. Somos cegos visionários, de olhos que vêem, mas que não enxergam. Temos rostos, semblantes e vontades escondidos por detrás dos nossos medos. Medos que se alicerçam sob nossas incertezas, incertezas das nossas incapacidades, dos nossos despreparos.
Nascemos. O ponto de partida, o palco da vida é, simplesmente, um ringue. Todas as criaturas (desconhecidas criaturas, opacas criaturas) que lá estão, portam armas. Armas pontiagudas, atiradoras. Não possuímos escudos, apenas cérebros, apenas mentes,
Entramos em um jogo. Viver é arquitetar, onde o maior estrategista “perpetua” suas formas, de regras mutáveis, numa verticalização de poder.
Não vivemos em estado estanque, a maleabilidade dos acontecimentos, das “regras”, das visões são alteradas à medida de necessidades, rápidas e drásticas, num doa a quem doer.