A Descoberta dos Mundos

Meu cálice de vinho noturno, a calma nos ouvidos e minhas mãos tateiam a “A Descoberta do Mundo” de Lispector. A cada página um sentimento de vivacidade me toma e percorre todo meu corpo, um coração pujante e uma alegria única de descobrir o mundo da autora. Descubro o mundo dela!

As vezes me perco com as ideias da criação de um universo, de um mundo. Um mundo em papel mas que anseia pela realização de uma veracidade tomada por experiências concretas. O quarto onde me encontro, espaçoso, amplo, com minhas obras e devoções, um espaço sagrado para o criar e consumir. Um lounge onde possa ser compartilhado o vinho e a champanhe, uma sofisticação aos ouvidos, aos olhos a á alma. Um momento meu, um lugar de poucos. Uma vista contemplativa perdida na imensidão de águas claras de uma Polinésia imaginariamente real. Um crepúsculo constante, uma alegria permanente acompanhada da melancolia sombria de uma alma insatisfeita. Um eu perdido em si próprio extremamente consumível, mas para si mesmo e para pouquíssimos eleitos.

A individualidade me fascina, o ser misterioso dotado de uma elegância secreta me instiga. Pode ser este meu mundo registrado na celulose, como também tantos outros que passam por esta inquietação noturna. Quero construir palácios medievais, dançar na roda de faunos, caminhar calmamente no caminho de Santiago ou mesmo queimar minhas retinas com o branco da neve. Quantos mundos possíveis e impossíveis.

Tenho medo de criar meu mundo, viver por ele, nele e apenas por mim. Não dou conta, não me pertence, embora ele se abriga no mais intimo e secreto. Não é para ser compreendido. Prefiro ir descobrindo este, que já enorme o suficiente e contraditoriamente pequeno. Vou adentrando as páginas de Lispector. Posso adaptar, ao meu intimo, ao que vivo e ao que me veem. Quando estou aqui, no meu cômodo decorado para me satisfazer, sou este ranzinza, egocêntrico e estupidamente exigente . Se é sempre? Não sei, também não me importa. Ele existe!

Assim que as páginas vão se passando, a música se elevando nos ouvidos, os pensamentos começam a incomodar. Quero bailes suntuosos nos salões de Versalhes, seres interessantes, mas que poderiam ser mudos frente às bestialidades, quero seres com voz para proclamar seus ideais! Quero aquilo que é controverso, quero passado, presente e futuro. Em mim os vivo. Faço-os viver. É extremamente necessário para minha sanidade!