Palavras, Palavras, Palavras...
Para “Words, words, words” de Shakespeare, sempre houve diferentes interpretações. Talvez por uma dessas, José Fernandes da Silveira, conhecido por Dedé, não se ufanava de saber muitas e muitas palavras. Quando falava, nunca as repetia. Suas frases, como vaidosas mulheres, só saíam à rua de roupa nova ou poucas vezes vestida. A memória de Dedé era prodigiosa, tal qual rico dicionário, com sinônimos e antônimos. Mas, se se tratava de poemas, crônicas e discursos, repetia-os sem deslize e com facilidade, como se fosse impecável gravador. Por isto mesmo, sem esforço, os lábios loquazes não se fadigavam, diziam e diziam, numa dicção invejável. Jamais alguma palavra fora do lugar, fora de sentido.
Notava-se, diante de tal versatilidade com as palavras, quem se entristecia de sabê-las tão pouco. Vez ou outra, um curioso lhe perguntava a definição ou o significado dos termos, analogias e trocadilhos. A mureta do Patamar da Igreja, onde se reuniam ao dia, era substituída, à boquinha da noite, pela calçada da casa do seu pai Didi, onde, após o jantar, admiradores de suas sarcásticas irreverências e histórias iam escutá-lo. Verdadeiras aulas, onde reconhece Neumanne ter aprendido os versos de Anchieta escritos nas areias da Praia de Iperoig, em Ubatuba. Na certeza de que Dedé repetiria discursos e sermões, muitos preferiam a brisa da sua calçada ao calor dos ambientes fechados ou da Matriz Jesus, Maria, José, de Uiraúna, púlpito do brilhante orador, filho da terra, Dom Luís Fernandes, seu irmão: – Vais à Igreja? – Não, à noite, Dedé repete.
Dedé nem via, nem lia, era cego. Dizia aprender com o vento. Sem mapa, sabia de cor as metrópoles brasileiras e estrangeiras. Enxergava melhor do que certas visões onde elas se situavam. Admirável quando distinguia as semelhantes casas da cidade, pelas pequenas diferenças dos seus batentes. Escutar era a sua leitura; o que ouvia guardava sem o perigo das traças, sem o mal do esquecimento, sem apagar da memória a boa literatura ou a beleza camoniana dos épicos. As palavras se calaram, Dedé morreu. Esvaziou-se sua calçada, passa por lá apenas a brisa, vinda do Aracati. Pergunto, a seu irmão João Bosco Fernandes e aos seus parentes Aécio Pola e José Neumanne, onde encontrá-lo. Mortos não falam. Contudo, ressoam nos céus, como proverbializou Horácio: “... a palavra, uma vez lançada, voa irrevogável”, o que se completa em referência a Dedé: palavras aprendidas com o vento; frases em asas, alegrias do tempo.
Para “Words, words, words” de Shakespeare, sempre houve diferentes interpretações. Talvez por uma dessas, José Fernandes da Silveira, conhecido por Dedé, não se ufanava de saber muitas e muitas palavras. Quando falava, nunca as repetia. Suas frases, como vaidosas mulheres, só saíam à rua de roupa nova ou poucas vezes vestida. A memória de Dedé era prodigiosa, tal qual rico dicionário, com sinônimos e antônimos. Mas, se se tratava de poemas, crônicas e discursos, repetia-os sem deslize e com facilidade, como se fosse impecável gravador. Por isto mesmo, sem esforço, os lábios loquazes não se fadigavam, diziam e diziam, numa dicção invejável. Jamais alguma palavra fora do lugar, fora de sentido.
Notava-se, diante de tal versatilidade com as palavras, quem se entristecia de sabê-las tão pouco. Vez ou outra, um curioso lhe perguntava a definição ou o significado dos termos, analogias e trocadilhos. A mureta do Patamar da Igreja, onde se reuniam ao dia, era substituída, à boquinha da noite, pela calçada da casa do seu pai Didi, onde, após o jantar, admiradores de suas sarcásticas irreverências e histórias iam escutá-lo. Verdadeiras aulas, onde reconhece Neumanne ter aprendido os versos de Anchieta escritos nas areias da Praia de Iperoig, em Ubatuba. Na certeza de que Dedé repetiria discursos e sermões, muitos preferiam a brisa da sua calçada ao calor dos ambientes fechados ou da Matriz Jesus, Maria, José, de Uiraúna, púlpito do brilhante orador, filho da terra, Dom Luís Fernandes, seu irmão: – Vais à Igreja? – Não, à noite, Dedé repete.
Dedé nem via, nem lia, era cego. Dizia aprender com o vento. Sem mapa, sabia de cor as metrópoles brasileiras e estrangeiras. Enxergava melhor do que certas visões onde elas se situavam. Admirável quando distinguia as semelhantes casas da cidade, pelas pequenas diferenças dos seus batentes. Escutar era a sua leitura; o que ouvia guardava sem o perigo das traças, sem o mal do esquecimento, sem apagar da memória a boa literatura ou a beleza camoniana dos épicos. As palavras se calaram, Dedé morreu. Esvaziou-se sua calçada, passa por lá apenas a brisa, vinda do Aracati. Pergunto, a seu irmão João Bosco Fernandes e aos seus parentes Aécio Pola e José Neumanne, onde encontrá-lo. Mortos não falam. Contudo, ressoam nos céus, como proverbializou Horácio: “... a palavra, uma vez lançada, voa irrevogável”, o que se completa em referência a Dedé: palavras aprendidas com o vento; frases em asas, alegrias do tempo.