Entre créditos e débitos...
Olhava o pôr-do-sol em frente ao mar. Era 31 de dezembro e 2010 pegava carona com os últimos raios de luz, uma viagem sem volta. Amanhã o sol trará outro ano e a agenda que guardo na bolsa será passado. Preciso de uma agenda nova para projetar o futuro, a famosa lista de desejos para o ano novo. Mas antes de substituir as agendas, preciso fazer um inventário, de posse dele, farei um balanço de minha agenda.
Comecei pelas realizações, uma lista de todas as conquistas: profissionais, materiais, sentimentais. Por certo, a lista não será muito extensa, mas também não aparentará insignificância. Surgiu uma dúvida, que valor devo atribuir a cada uma delas? Já que vou fazer um balanço, ao finalizar, minha agenda deve apresentar um saldo credor ou devedor. Difícil quantificar realizações! A quem devo atribuir mais valor: a uma nova amizade ou a uma dívida quitada? Ora, amizade não tem preço e nem valores, mas se estou cheia de preocupações como ter a leveza necessária à entrega que as novas amizades precisam para se fortalecer? Fica a dúvida. Folheio a agenda e recordo um fato que, por certo, terá muito valor: encontrei um amor, mas, passadas algumas folhas, percebo o engano, e o que somaria créditos, aumentou os débitos. Em uma folha bastante rabiscada encontrei um poema, eu o fiz para uma das realizações sentimentais, era um poema feito para outro poeta. Não sei o valor das realizações, mas sem dúvida, Alonso Rocha é a mais valorosa de todas.
Pouco a pouco a lista ia se compondo, mas nem só de créditos vive um balanço, então passei a computar os débitos. Esses são muitos, os desejos não realizados são sempre mais populosos. Deve ser porque tentamos pegar tudo o que desejamos sem nos dar conta que alguns desejos só nos fazem felizes porque são desejos. Pensei no curso de inglês que preciso começar e que vou sempre empurrando para o próximo ano. As línguas anglo-saxônicas sempre me pareceram sérias demais, talvez porque devo associá-las à imagem britânica com sua pontualidade, seu formalismo e toda sua postura de reis e rainhas, prefiro o charme e a leveza das latinas. Mas, esse é um débito que implicará em outros que por tabela serão tolhidos, devo atribuir um valor bem alto para ele. Num cantinho de uma página esquecida encontrei um débito maior ainda, uma lista de pessoas a quem eu deveria ter ligado para resgatá-las do buraco negro de meus pensamentos. A escuridão tomou conta dessa página.
A lista parecia não ter fim. Créditos e débitos listavam meus compromissos, minhas vitórias e minhas frustrações. Os cálculos me levaram a transportar os débitos da agenda do passado para a agenda do futuro, e, acreditem, fiquei feliz com o resultado. E por que fiquei feliz com o saldo devedor? Porque são os desejos que me fazem acreditar que o ano que inicia, com todas as suas possibilidades, será sempre melhor do que o que se foi. Afinal, ano novo, vida nova, agenda nova...