O Bailarino Manco
No palco todo circular e nostálgico do anfiteatro ele dançava, fazia piruetas lentas e rápidas ao mesmo tempo. Quem o olhava poderia jurar ter perdido à hora, ou alguns outros, dispostos de dádivas, até mesmo se aliviar: era cedo demais.
Em sua volta, próximos das cortinas, às vezes estavam um ou dois, outrora eram cinco e também poderiam ser feitos das metades, seis e meio ou apenas um quarto.
Ele era incomum, mas as pessoas acabaram por se acostumar à sua presença com o passar do tempo, e a ver aquele bailarino medonho, senhor de uma perna monstruosamente maior que a outra. Ninguém mais estranhava vê-lo valsar por sua vitrina, principalmente os que dele já compartilhavam desde que vieram à luz. Os compassos eram perfeitos, mesmo solitário aquele bailarino manco tinha uma perfeição do ritmo e do compasso, nunca perdia as simetrias do tempo, toda a fita do universo prescrevia-se na sua dança mágica e sem composição, formada pela musica dos astros e pela sinfonia arquitetada apenas pelo silêncio.
Bailarino imortal, mentira de quem inventara tal calúnia: Certo dia o palco tornara-se vazio, ninguém veio assisti-lo, o bailarino finalmente havia cessado as pernas num ângulo de morte, próximo à casa dos noventa graus. Estava sepultado então todo o teatro da vida, mas bastou um passo e uma troca de almas para que ressurgisse de novo em meio à dança espiral: A pilha do relógio analógico, o bailarino perneta, fora substituída, as horas finalmente voltavam a passar.