Têmporas
Era uma ampla sala de aula, no prédio espelhado e azul da faculdade. O professor alto de óculos, dizia, mexendo com as mãos a barba rala, que aquela manhã seria especial, pois faria alguns testes orais, com o fim de avaliar o nível de estudos, escolhendo ao acaso alguns sortudos.
Seus olhos perscrutaram a sala ligeiros, fixando-os diante de Pepeyo, disparou: - Esmiuce a teoria das normas de Hans Kelsen, meu caro doutor.
Pepeyo corou e suas têmporas logo umedeceram-se de suor, principiou a gaguejar algumas sílabas, quando ao fundo da sala um homem deu um urro de dor, o que chamou a atenção de todos, o homem debatia-se e contorcia-se com gritos...suas mãos alongaram-se e espessos pêlos cresceram aceleradamente, sua fronte alargou-se com seus ossos do crânio dando forma a cara de um cão feroz, presas pontiagudas apareceram-lhe no lugar dos dentes, sua roupa rasgou-se com o volume do corpo aumentado, rodopiava em torno de si uivando como um lobo. Ouviu-se de uma senhora, que assistia a cena de pernas cruzadas a exclamação: - Meu DEUS é um demônio!!!
Licantropia - doença genética (ou uma maldição) que na lua cheia ou no sol fervente de verão transforma seres humanos em bestas medonhas, a doença (ou maldição, não se sabe!) era já uma epidemia em Sampa, vendo-se pelas esquinas e ruas homens, mulheres e crianças (engraçado que não pegava nos velhos) transfigurando-se em feras.
Deixou de ser um homem, era já um lobo inteiro e acabado com olhos vermelhos e presas à mostra, encarou a todos na sala, que em pânico permaneciam parados, então deu um salto como um adorável totó de uma dama e saiu uivando corredores à fora...
O professor ajustou os óculos estilosos no rosto e continuou a perguntação, com a bagunça esquecera-se de Pepeyo e da teoria das normas de Hans Kelsen e recomeçou por outro azarado. Pepeyo enxugou o suor das têmporas e aliviado, deu graças por estes estranhos males que andam acometendo a humanidade.