É ALMA DO OUTRO MUNDO
Miguel Pinheiro trabalhava embarcado em um desses navios que faziam viagens para o sul e que por vezes ficava meses viajando. Certa vez, o navio aportou em Areia Branca nas proximidades da praia de Upanema, porém já era noite alta e o desembarque só seria efetuado em Areia Branca no dia seguinte. Miguel, entretanto, como havia meses que não via a família, não suportou a ansiedade de esperar até o outro dia e resolveu desembarcar ali mesmo em Upanema e iria a pé até Areia Branca, que distava aproximadamente cinco quilômetros dali. Decidido, pediu ajuda a um colega que o transportou em pequeno barco até a praia, de onde começou a empreender a jornada noturna.
Era época de lua nova e a escuridão grassava por toda parte e Miguel não era lá aquele exemplo de coragem, principalmente quando se tratava de alma do outro mundo. Naquela época ainda não havia estrada constituída e o caminho era coberto de pés de cera, arvore de tamanho médio constituída de largas folhas, que ficavam a balançar com o vento uivante, característico de regiões meio desertificadas, o que tornava o caminho ainda mais tenebroso.
Miguel com o coração aos pulos, confundindo aqui e ali, os pés de ceras com vultos fantasmagóricos, já encontrava-se um tanto quanto arrependido por ter decidido empreender aquela aventura.
Lá pras tantas, percebeu um vulto a certa distância, que parecia estar se movendo em sua direção, impressão que se confirmava a cada passo. A certa altura, já tremendo de medo, escondeu-se por trás de um pé de cera e começou a rezar para ver se sumia aquele vulto que cada vez mais se aproximava e percebendo que suas rezas não eram suficientes e o vulto já a alguns passos do pé de cera que lhe servia de esconderijo, soltou um grito de medo tão alto e tão bizarro, que o pobre do vulto saiu correndo em disparada gritando:
-Valha-me Deus, é alma do outro mundo!