Suicida em potencial??

Sou apenas carne, respiração e órgãos com movimento e livre caminhar. As luzes não se acenderão sobre mim. Não subirei ao palco. Não farei história. Serei apenas plateia do meu próprio espetáculo. Os ingressos não foram vendidos, a bilheteria se fechará por falta de público. Baratei o preço, mas não crie esperança. Não alimente expectativas, pois as coisas não acontecerão. Não haverá história.

A peça ainda não chegou ao fim, mas a tendência é que tudo se mantenha igual. Sem clímax, ápice ou apogeu. Sou personagem plana. Secundária na minha própria história.

O espetáculo segue em ritmo lento, sem grandes diálogos ou um bom enredo. Não me acusem, ou pelo menos não apontem todos os dedos para mim. Sou mera personagem. Improviso algumas falas e ações, escrevo algumas cenas, mas não estou no controle.

Claro, que poderia escrever a última cena e decidir o momento final, mas esse é o tipo de atitude que só os corajosos podem tomar.

Sei que suicídio é desistência. Tirar a própria vida é reconhecer que não pode ou não quer enfrentar os problemas ou suportar a dor que a vida lhe infligi. Mas também é coragem desmedida.

Não há dúvida de que a morte é a maior de todos os mistérios. E pode haver ato mais corajoso que se lançar ao desconhecido? Por mais que se diga ou que se duvide sempre existirá questões e incertezas.

Pode ser que a morte seja apenas um corpo preso ou guardado em uma caixa de madeira alguns palmos abaixo da terra. Pode ser que sejamos apenas corpo e que todas as questões filosóficas ou religiosas sejam apenas questões. Por outro lado céu, inferno, purgatório, castigo e tudo que pregam os religiosos pode ser realidade. E assim sendo, suicidar-se seria o mesmo que se prender eternamente a uma dor da qual não temos a mais vaga ideia de sua dimensão.

No entanto, é certo que a imensa maioria dos suicidas não acredita em nenhuma dessas concepções. O que é claro não diminui em nada a sua coragem, pois mesmo para quem vive em total descrença, continua sendo o desconhecido, o incerto. E não pode haver nada mais aventureiro do que lançar-se ao desconhecido.

Dominique Gasparin
Enviado por Dominique Gasparin em 01/01/2011
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