Dia da confraternização universal. ( Sub título : Não temo as palavras nem meus sentimentos)

Um menino que hoje tenha 12 anos de idade é bem diferente do menino da mesma idade em 1961. Eu tinha 12 anos em 1961 e lembrei isso hoje de manhã ao sair para tomar meu café de padaria. Não tomei meu café, esqueci do feriado, tudo fechado, nem tudo mas teria que andar muito para chegar ao botequim que sei está Aberto, estou tentando evitar a fadiga como o carteiro Jaiminho. Se você não sabe quem é o carteiro Jaiminho é porque você não é uma criança grande é apenas Adulto.

Ao voltar para meu cantinho o porteiro assoviava uma canção dos meus 12 anos. Parei diante do mural onde o síndico coloca papéis enaltecendo sua competência administrativa, estava apenas disfarçando, não lia nada, só queria ouvir a canção que o porteiro assoviava com perfeição. Era a música tema de seriado de televisão que eu e meu irmão número 1 não perdíamos episódio, Bat Masterson. O herói perfeito era Bat Masterson; bonito prá cacete, elegante prá cacete, rápido no gatilho, pegava todas as mocinhas mas não comia nenhuma, afinal eram mocinhas, não se deve comer mocinhas e Masterson era a cima de tudo um cavalheiro.

Fazia parte de sua vestimenta uma bengala preta com as pontas douradas. Com aquela bengala muitas mãos e cabeças de bandidos foram quebradas. A bengala dele até dava tiros quando necessário, mas raramente ele usava a bengala como arma de fogo. E a gente gostava mesmo era de ver a bengala batendo nos homens maus. Nunca um bandido conseguiu derrubar o chapéu coco da cabeça de Bat Masterson, por mais forte que fosse a porrada acertada na cara dele. Era perfeito aquele grande homem da lei.

Eu tinha 12 anos e meu irmão 11 anos, até hoje mantemos essa diferença de idade hoje eu tenho 61 e ele 60. Imagine como ficamos contentes ao saber que nosso herói estava no Rio de Janeiro, imagine como ficamos contentes ao saber que ele iria se apresentar no Maracananzinho. Imagine como ficamos contentes ao saber que a gente ia ao estádio ver nosso herói ao vivo, nosso herói na nossa frente. Pois é, nós fomos. A mulher que nos pariu ganhou 4 convites para vermos Bat Masterson.

Matamos nossos amiguinhos de inveja, contamos para todos eles, alguns não acreditaram, outros ficaram contentes com nossa sorte. Eu e meu irmão só falávamos das coisas que a gente ia fazer com Bat Masterson. Meu irmão ia arrancar o chapéu dele e eu ia pegar a bengala e sair correndo. Planos de meninos aos 11/12 anos em 1961. Os meninos de hoje nessa idade sonham em arrancar a calçinha da gostosa da novela das 8.

Como eu disse, a mulher que nos pariu tinha 4 convites. Para ela, eu, meu irmão e um primo. O primo era filho de sua irmã, a única irmã das que ela tinha que eu odiava tanto quanto a ela. Mas o primo não foi, não tinha idade para entrar. Começou a apresentação. Entrou no palco o apresentador que também fazia a dublagem do nosso herói Murilo Nery. No palco a fachada de um Saloon, apenas a fachada. Nosso herói deu bengaladas em índios e bandidos.

A fantasia dos índios eram ridículas, a fachada do saloon era ridícula, tão ridícula que desabou, quase acerta índios bandidos Masterson e Murilo. Mas chegou o grande momento, o momento que todos os meninos esperavam. O sorteio da bengala do Bat Masterson. Adivinhe quem ganhou a bengala??

Quando o Murilo Nery falou o número sorteado, a mulher que me pariu ficou de pé e começou a gritar e acenar para o palco. A gente tava na arquibancada. Foi chamada ao palco. Não levou nem a mim nem meu irmão, foi sozinha. Filha da puta. Nosso herói ali perto da gente e a vaca foi sozinha, deixando a mim e a meu irmão sozinhos no meio de uma porrada de gente estranha. A raiva e o medo. Raiva da filha da puta não levar a gente e o medo do abandono. Mas o melhor ainda estava por vir.

A bengala não seria nem de meu irmão nem minha, seria para o primo que não foi. Muitos anos mais tarde e com muito mais ódio por ela, e sua irmã cujo maior prazer de sua vida era espancar a mim e meu irmão, percebi porque a bengala foi para meu primo. Era um pagamento feito a nossa feitora por ficar em casa com a gente enquanto ela, a mulher que nos pariu, passeava pelas quintas museus, bondinhos, redentores, praias etc...

Hoje é dia da confraternização universal.
Estou confraternizando.

 
Yamãnu_1
Enviado por Yamãnu_1 em 01/01/2011
Reeditado em 06/10/2011
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