NÚMEROS DA INDIGNAÇÃO
Símbolos de proporções inalcançáveis... Os números se multiplicam nas notícias expostas, subtraem alguns sonhos irrealizáveis, somam encargos contratuais... Nos reduzidos orçamentos, ganham proporções de difícil compreensão.
Observo os percentuais indicados como taxas e juros aplicados e componho as grandiosas construções armadas nos pequenos alicerces representados. Os juros bancários, as tantas ofertas de empréstimos pessoais, os pretendidos reajustes salariais, o mínimo sem representação nas prateleiras dos supermercados, a inflação contida nos relatórios oficiais, os símbolos da economia informal, o aumento dos combustíveis, a subtração do emprego...
Novas projeções numéricas ganham destaque no cenário. As articulações políticas, desenhadas nas planilhas do quorum para votação do novo “mínimo”, são especuladas na mídia.
Sobem as cotações nas Bolsas. A instabilidade das moedas desenha novos algarismos significativos nos gráficos divulgados... Os jornais publicam novos números com matérias cada vez mais repetitivas. Tudo parece ficção nas informações em negrito propagadas na sociedade. Os ganhos reais favorecem alguns personagens, as perdas se inserem no orçamento da maioria da população.
A manchete chama atenção. Número de milionários cresce no primeiro ano do governo dos trabalhadores. Somos manipulados pelo significado positivo da palavra crescimento e demoramos a perceber a grave denúncia sobre a desigualdade no tratamento do capital na sociedade em desenvolvimento. A pesquisa, realizada por um banco americano de desenvolvimento, indica o crescimento de seis por cento, com perspectiva de aumento nos próximos anos. O percentual representa apenas cinco mil novos afortunados. Pelo menos cinco bilhões de dólares centralizados nas mãos de poucos...
Cresceu o investimento? Aumentaram as vagas de emprego? E os índices de desenvolvimento? Não... Infelizmente as legendas explicam que o crescimento do número de milionários foi originado nos ganhos de mercados de ações e das oscilações do câmbio. As perspectivas de taxas crescentes dos números de milionários brasileiros são reflexos do aumento da fome, da miséria, do desemprego...
A concentração de renda nas mãos de oitenta mil milionários contrasta com os milhões de miseráveis, brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza e que buscam a representação de suas necessidades nas inexpressivas cifras do salário mínimo, na garantia de um emprego ainda que informal.
A realidade econômica ganha contornos absurdos. Como entender números tão distantes? Compreender que, enquanto poucos milhares são promovidos à condição de milionários, muitos milhões não se compreendem como indivíduos?
Novas operações são armadas no pensamento de quem ainda não se subtraiu. A indignação multiplica outras emoções...
O poder aquisitivo da classe média é esmagado nos juros bancários. Pequenos empresários fecham as portas nos rombos bancários e nos endividamentos constantes à margem dos mercados virtuais dos capitais financeiros. Crescem o desemprego e a economia informal.
Os investimentos na construção civil, na indústria e no comércio estão comprometidos no mundo virtual da especulação. Tais aplicações são páginas de um modelo econômico ultrapassado.
Meus valores ganham uma nova divisão no crescente percentual da indignação. Um novo índice ganha destaque no presente: a elevação desenfreada do desencanto e da apatia de milhões de brasileiros.