O FERIADO PROLONGADO NA CIDADE DE SÃO PAULO

Ricardo perambulava pela avenida de um movimentado Bairro da Cidade de São Paulo, não muito distante do Centro, sem que se observasse o grande movimento de veículos e de transeuntes, próprio do meu, do seu e dos demais Bairros de outras pessoas, nas megalópolis. A justificativa para a ausência de pessoas que, em veículos ou andando às pressas, ocupam os lugares foi o feriado prolongado e a ânsia de deslocamento para o litoral ou para o interior do Estado, que leva consigo a turba atordoada.

Há pessoas que se dedicam até exaustivamente aos labores do dia a dia e transformam o lugar em que habitam em uma oficina de trabalho, onde apenas as ferramentas de uso são avistadas, guardadas e utilizadas até exaustão do material, quando então são substituídas por outras, sem ao menos permanecer a lembrança de quão útil foi a ferramenta despejada.

Há outras pessoas, entretanto, que também se dedicam até com exaustão, ao trabalho ou ao estudo, no local onde habitam, porém sem desprezar à existência do belo, por exemplo do cenário natural no qual desempenham seu papel de pessoa humana. Estes não são tomados da ânsia de deslocamento para o litoral ou para o interior do Estado. Ricardo é uma pessoa que se enquadra neste segundo exemplo.

Sem o apinhamento de pessoas ou veículos, no bairro em que reside Ricardo, a ele é possível, nos feriados prolongados, dirigir-se tranquilamente à padaria, vestindo confortáveis calças – ou calça, como se fala no Brasil – modelo bermuda que não cobre as pernas por inteiro; chinelos e camisa solta no corpo, sem ser molestado por filas imensas de veículos, na espera de sinal favorável, e a rapidez dos pedestres, além da grande toxidade do monóxido de carbono, expelido pelas descargas dos veículos e das indústrias.

Assim que saiu de sua casa sentiu-se melhor em caminhar pelo asfalto da rua e não pela calçada, reservada aos pedestres, finalidade que não pode ser alcançada porque a impede o excesso de fezes de animais que distraidamente são puxados pelos donos, como em exibição de respeito e apreço à raça canina. O apreço é tanto que o animal é conduzido pela utilização de uma corrente de correia envolta ao pescoço. A consideração é tanta que é preferível impregnar o local por onde passam as pessoas, do que o quintal ou o apartamento onde se reservou um cantinho para o mimoso bichinho. É preferível, portanto, que terceiros assumam a tarefa de efetuar a limpeza dos dejetos a obrigar que a cumpra os próprios donos.

Enfim, Ricardo preferiu caminhar sobre o asfalto da rua, pela razão já exposta e, também, porque não corria o risco de ser atropelado por um veículo: a rua estava deserta.

Em seguida, ouviu o pipilar de um pássaro, proveniente de uma árvore que fora plantada há alguns metros de sua residência e que permanecia ofuscada pelo movimento de uma grande cidade. Naquele momento em que era fitada por Ricardo tudo era diferente. Os galhos eram mais verdes, as flores mais viçosas, as pontas perfuravam o vazio com a pretensão de tocar nas nuvens algodoadas que também eram notadas por Ricardo naquele momento. Até o ar, respirável, era sentidoe com muita alegria.

Seguiu em frente e dobrou a primeira rua, à esquerda, e chegou até outra via, esta de intenso movimento, não fora o dia de feriado prolongado, porque com a presença deste fenômeno, a rua era quase deserta e somente não o era porque, ao proprietário da padaria, tornou-se possível estacionar seu pequeno veículo, modelo Van, do qual fazia uso para entrega de pães nos bares e restaurantes da região. O veículo, em dias úteis, não podia ser estacionado no local, porque atrapalharia o trânsito, seria multado ou até mesmo abalroado por algum piloto dotado da síndrome conhecida por maluquice de motos.

Lembrou bem, Ricardo, da ausência de motos, dos malucos, do barulho, do medo, do terror e da vontade de não sair de casa. Ali estava ele, livre do ônus do progresso, da ânsia humana, da falta de solidariedade, do desprezo ao próximo, da vida humana enfim.

Sentiu, à distância, o precioso aroma de pão a sair do forno; apressou os passos para deliciar o produto, ainda quente. Apenas alguns fregueses da padaria esperavam pelo precioso alimento. Sem pressa e tranqüilos conversavam entre si e um deles, sentado em uma cadeira que se atrevera a permanecer fora do balcão, sem ser molestada, fez a pertinente observação: - Como é bom viver assim! Tranquilo e sem a loucura do dia a dia.

Ricardo, ao ouvir a referência despretensiosa daquela pessoa, lembrou de sua infância, mais ou menos há cinqüenta anos, e percebeu o grande número de mudanças, na forma de viver das pessoas. O balanço que fez foi no sentido de que sopesando os prós e os contras do progresso, este é, de fato, irreversível porque a humanidade o persegue, mas que o preço a pagar é muito alto isso não resta dúvida. Que o diga o dia seguinte, quando terminou o feriado prolongado.

ACLIBES BURGARELLI DEZ.2010

aclibes
Enviado por aclibes em 30/12/2010
Reeditado em 30/12/2010
Código do texto: T2699767
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