BAHIA DE TODOS OS MEUS SONHOS

Maria Feijó cronista. Maria Feijó poetisa. Apresenta um livro de poemas. E se pergunta:

- “Se sou poetisa?”.

Para responder:

- “Não sei. Apenas sinto aflorar-me à pele a sensibilidade e tenho dentro d´alma a emoção. Se estas características constituem a poetisa, então poderei ser assim chamada”.

Eu lhe respondo que sim. Eu, que já me fiz semelhante pergunta. Eu, que os li, a tantos e não encontrei mais que em Maria Feijó:

Num pensamento enfeitado

o sentimento aflorando,

o coração transbordando

para as belezas da vida,

para as grandezas do amor!

O sofrimento...

O sofrimento também!

E a indefinível saudade

que faz da gente poeta.

Eu lhe respondo que sim. Maria Feijó é poetisa.

E poetisa perfeita.

Sem escolas definidas,

sem forma rigorosa,

sem requintes de luxo...

Mas, de um estilo forte e comunicante, envolvente, embalador. Paisagens pode-se dizer, tiradas a bico de pena. E o ritmo moderno, longo e polimétrico – o mais adequado para as paisagens onde há mar, praias, sol, coqueirais e pessoas, beleza, poesia.

E tem mais: Maria Feijó de Sousa Neves fez temporada de sucesso nos jornais de Alagoinhas, ainda na adolescência. Era, então, a Marijó que o sertanejo lia e relia no sabor das crônicas primeiras, dos primeiros poemas. Não é, pois, autora desconhecida no sertão baiano.

Agora, com o seu BAHIA DE TODOS OS MEUS SONHOS, livro de poemas onde tudo é Bahia e em que a poetisa é toda carinho e meiguice para com a terra que lhe foi berço – esperamos, os seus admiradores, sertanejos, que seja lida e se faça conhecida Brasil a fora. Tenho bastante confiança, ao concluir a leitura do livro, para dizer à autora: - Adiante, Marijó! Seu livro é bom e será bem recebido. Não se arreceie de eventuais tempestades. A bonança vem logo mais. Não tema dizer-se poetisa, orgulhe-se de sua poesia e repita – eu sou poetisa.

Mas... Quem se disporia ao prejuízo certo de um livro de poemas? Sobretudo de autor modesto e desconhecido do grande público ledor, dos jornais metropolitanos, da crítica literária?

A solução é apelar para os próprios recursos, quase sempre escassos. E confiar em que, algum dia, de algum lugar chegará a compensação em palavras assim:

- Ótimo! Tem umas coisinhas que eu gostaria de ter escrito... E como é bom a gente ler aquilo que gostaria de escrever!

Pois bem, posso dizer que Maria Feijó tem produções que eu desejaria escritas por mim. Digo-o sem inveja mesquinha, naturalmente. Antes, entusiasmado pela poetisa. E digo com razão:

“Calendário Baiano”, por exemplo, é o que, de janeiro a dezembro:

“Janeiro,

dia primeiro,

festa do Senhor dos Navegantes

que é toda no mar ".

“E o nome do Senhor do Bonfim da Bahia

se evola pelos céus do Brasil,

pelos céus do mundo,

pela imensidão dos espaços "...

“E a fé cristã

se com funde à crença fetichista

redundando numa originalidade de festas...

Rio Vermelho embandeirado,

enfeitado,

vestido no seu mais rico vestido

para receber Janaína pagã “...

Isto é poesia e folclore, e é um guia turístico da Bahia dos sonhos de tanta gente! Tem efó... Abará... tem caju e cocada da bahia...

E “Abaeté”? Que primor! Cheguei a arranjar uma musiquinha, cantarolando os versos:

“Lagoa branca,

lagoa bonita,

lagoa negra,

lagoa rica...

Que mistérios escondes

nas tuas águas?

... E as lendas respondem

na pedra que canta,

no silêncio das noites:

São corpos de amantes

apaixonados”...

Folclore, poesia e a crônica bonita de São Salvador.

O sonho sonhado do amor. Lirismo mavioso, bom para repetir-se de cor, andando a toa pelas praias. E para musicar também:

‘Itapoã medita...

...cochila...

parece dormitar

na hora sonolenta do crepúsculo “.

“Itapoã desperta...

É a jovem cheia de ventura

encantada com os primeiros arrobos de amor!

Itapoá sonha...

...prateada de lua,

embebida de ventura

na delícia de sonhar”.

Aqui Itapoá parece sonhar com a poetisa, despercebida do mundo. E aquilo só é o mundo inteiro.

Agora é como se estivéssemos no trem de Alagoinhas a Salvador:

“Se os cajueiros estão florido

E as alamedas perfumando

E as estradas colorindo”...

A poetisa vai cantando,

No seu mundo de amor, de amor colorido.

No seu mundo de poesia, de poesia enfeitado.

Mundo de todos os poetas, colorido de paz.

Mundo que não é mais

que um sonho bom

eternamente acalentado:

“Cigarra, minha cigarra,

querida do coração.

Cigarra lembras a vida

Passada noutro rincão”...

Setembro de 1965.