UMA ÈPOCA MARCANTE
Lêda Torre
Com apenas nove anos de idade, eu estudava a 4ª série primária, no Grupo Escolar João Pessoa, a melhor escola pública da cidade, ou seja, a única, e me preparava com essa idade, para o famigerado Exame de Admissão ao Ginásio, onde eu se fosse aprovada, estudaria no Colégio Maior do lugar, o inesquecível CINEC - Centro Integrado de Educação de Colinas, até o curso Normal do Magistério, meu sonho, de ser professora, um dia. Colocar os filhos naquele colégio grande, dirigido pelo então pároco da cidade de Colinas, era também o sonho de todos os pais. Estudar ali era certeza de um futuro garantido.
O CINEC, era referência nacional, atendia estudantes até da capital, com sua pedagogia moderna, os municípios adjacentes daquele região, mandavam seus filhos estudar em nossa cidade. Tudo ali era frutífero. Era certo o estudante do CINEC ao vir prestar vestibular na capital, era um dos melhores classificados, tanto na Universidade estadual, quanto na federal.
A pedagogia da época, era ímpar, naquele tempo, meados dos anos s60, 70, 80 respectivamente, só não cresceu quem por aquela escola de renome, não passou. Todo mês de junho, realizava-se uma semana do Ciclo de estudos, com mesas redondas, debates, plenária, elaboração de documentos como a Constituição do nosso Grêmio Estudantil Pio XII, o Regimento Interno da Escola, as normas do Escotismo , chamado Milícia Estudantil, tudo isso fiz parte, ali se exercitava a democracia através das eleições para deputados , um por turma, senadores, e presidente do Grêmio, cujos pré-requisitos sempre fora boas notas, militâncias nos movimentos estudantis internos, participação nas Feiras de Ciências, cujas apresentações eram feitas até no Rio de Janeiro, se não me falha a memória.
E, como fui aprovada logo na primeira etapa, fui matriculada com apenas nove anos no curso ginasial. Sempre adorei estudar. Naquela 1[ série do ginásio, jamais esqueci minhas aulas de francês com o querido professor Tony Macedo, hoje residente em Belo Horizonte.
Adorava fazer pesquisas, e como estudava nesse primeiro ano, à tarde, pela manhã, ao abrir a grande biblioteca do CINEC, estava eu e meu irmão para as primeiras pesquisas naquelas enciclopédias, a nossa internet de hoje, ali tinha tudo que queríamos. Enciclopédias como a Conhecer, a Larousse, a Barsa, a Mirador, a Tesouro da Juventude, dentre tantas outras.
A disputa pelo espaço na biblioteca e pela posse dos livros, era uma correria só. Todo mundo queria chegar primeiro. E éramos motivados a ler, a pesquisar, a nos prepararmos para os debates em grupos, e tudo era novo, dava vontade de participar em todas as aulas.
Novos professores, novas disciplinas, diferentes das disciplinas do ensino primário, novos colegas, que até hoje temos muitos amigos desse tempo, e todas as vezes que nos encontramos, normalmente mês de julho ou dezembro, lá na nossa cidadezinha natal, nos perdemos no tempo, lembrando de nossas estrepolias, brincadeiras e sobretudo do compromisso que tínhamos com os estudos.
Fazia parte das nossas aulas de língua Portuguesa, a leitura dos livros de Literatura Brasileira e Universal, clássicos que jamais esquecerei, como O Pequeno Príncipe, O Menino do dedo verde, Iracema, As Pupilas do Senhor Reitor, Polyana menina e Polyana moça, O guarani, Éramos Seis, Meu pé de laranja lima, etc. Obras que me despertaram mais ainda o prazer por ler e escrever, como gosto muito. Inclusive , a influência na escolha do curso de Letras, que estudei, e me formei.
Aquela época me marcou bastante. Apesar de viver na fase histórica da ditadura, me lembro bem, mas ainda não me afetava, porque criança e adolescente não se misturava com os assuntos de adulto. Palavras que soavam bastante aos meus ouvidos foram: comunismo, Cuba, União Soviética, Guerras, carestia, Bossa Nova, MPB, Jovem Guarda, etc. Fora os ídolos como Roberto Carlos, Wanderley Cardoso, Jerry Adriane, Wanderléa, Erasmo Carlos, Diana, Odair José, Paulo Sérgio, Antônio Marcos, Vanusa, etc. Músicas lindas, românticas que mexiam com os nossos corações ainda tão puros.
Época áurea dos grandes festivais, já ouvia falar também de Gilberto Gil, Caetano Veloso , Gal Costa, Maria Betânia, Sérgio Reis, José Roberto, dentre outros. Na TV as famosas novelas, as redes de Televisão eram a TV Tupi, a TV Globo, a TV Record, a TV Manchete, etc. o movimento hippie, os tropicalistas, como Wilson Simonal, o Jairzinho, a Elis Regina. Os internacionais, Os Beatles, Os Roling Stones, Elvis Presley, etc. Outro fato que também não vou esquecer foi a morte do presidente da República Castelo Branco, num acidente de avião.
Eram muitas informações para uma cabeça tão jovem. Lembro-me ainda, que antes da TV chegar em Colinas, ouvi várias novelas pelo rádio, e era tão comovente, aquele contexto fazia nossas cabecinha sonhar tão alto, que um dia poderíamos ver e ouvir aquelas cenas que pelo rádio apenas ouvíamos as vozes e a sonoplastia.
O progresso chegava aos poucos, produtos da grande revolução industrial que sua influência se fazia chegar até Colinas, no médio sertão maranhense, o fogão a gás, a TV, a geladeira, o sofá em vez de cadeiras de madeira, a cama com colchão confortável, de molas, que não era de palha, como o que conhecíamos outros tipos de tecidos que não fossem somente chitas e chitões, nem só “o volta ao mundo”, apareceram os tecidos rendões, a malha fria, a lingerie, o algodãozinho, a cambraia, o tergal, o caki, a tricoline, o JK, o broderi, e outros, que me lembro muito bem. Até o vestir, declarava a condição social das pessoas.
A vitrola também apareceu, além dos disquinhos compactos, surgiram os LP’s hoje “cognominados” bolachões, os discos de vinil, com mais músicas. Era novidade bebermos água bem geladinha, porque anteriormente nas casas havia potes de barro, depois os filtros, e por fim a geladeira. O fogão a gás servia mais pra assar bolos ou fazermos um cafezinho rápido ou um chá. O grosso da cozinha era mesmo na lenha ou no carvão. Antes da geladeira, a carne era salgada e seca no sol, e não se comprava pra estocar, era somente o tanto de consumirmos.
Se for narrar muitas coisas que vivi nos anos idos de 60, 70 e 80 os mais marcantes, não concluiria agora esta crônica, com certeza. Mas todos estes fatos, e estas lembranças ficarão gravados para sempre na minha vida.
_____São Luis, 21 de dezembro de 2010_________