Diga Não ao Busão, Viaje de Avião!
(Este é o relato do meu ex-professor Neemias Félix)
Tudo parecia indicar que a viagem de Colatina a Linhares ia ser tranquila. E lá estava eu, universitário à época, subindo no busão da Viação Pretti, que fazia a linha namorando todo o tempo com o rio Doce da doce música de Zé Geraldo! Era meio-dia de um sábado qualquer de 1977. A viagem ia bem, se considerarmos que o atraso para pegar o papagaio esquecido ou o passageiro pedir para dar uma descidinha pra “ir no mato” são coisas normais. O que não contávamos era com o dilúvio que começou a cair vinte minutos depois da partida. E com as muitas vezes que paramos para empurrar o ônibus atolado. Na nona não teve jeito. O busão encostou no barranco e, como guerreiro cansado de tantas batalhas, recusou-se definitivamente a caminhar. No meio da estrada e com pouca ou quase nenhuma comunicação (na época não havia celular), acabamos dormindo na estrada. Alguns se aventuraram a sair a pé, já que moravam a poucos quilômetros dali. Para nós, entretanto, Linhares ficava muito longe para encarar a empreitada. A situação só não ficou pior, graças à ajuda de um solitário cavaleiro que nos trouxe uma boa farofa de carne de porco e um bom café. Tudo isso regado à conversa de um italiano que não parava de falar com seu sotaque característico. Os mosquitos, porém, entoavam a sua cantilena monótona, e os tape-tapes de mãos esmagando os inconvenientes iinsetos provocavam um ritmo estranho, jamais encontrável em qualquer música conhecida. A chuva caiu a noite inteira, e o frio era amainado apenas com as roupas e toalhas que nos serviam de cobertores. A manhã de domingo chegou alvissareira, e mesmo cinérea e de ar enzamboado, nos trouxe um motorista de táxi que tinha levado um fazendeiro morador daquelas plagas. Do meio da estrada até Linhares, ainda muito desce-e-empurra. Além de uma caminhada de dois quilômetros para pegar gasolina, numa vendinha, para o táxi, já que Donzelo – esse é o nome do taxista – não tinha lá esse senso de previsão. Finalmente, às dez horas, a chegada à Rainha do Cacau, como era então chamada a nossa cidade. E o fim de um trecho de pouco mais de cem quilômetros que demorou nada menos do que vinte e duas horas para ser percorrido, graças à participação desse personagem tão importante quanto folclórico da vida brasileira: o busão.