EQUILÍBRIO
Encontrei meu amigo, Zé da Bodega, o filósofo das verdades não ditas, pensativo. Sentado num toco de timbaúba, rodeado de espigas de milho secas, prontas para o debulho, mandibulando pensamentos. O velho bodegueiro da Paupina de Messejana de Fortaleza, do meu Ceará agreste queimado pelo sol de 365 dias, a pino, estava de cara fechada – cu de touro, como diz aqui. É bom que se diga acerca. Perguntado sobre o significado deste axioma, o meu amigo quelônio que sabe tão bem polir o tempo com a flanela da esperança, respondeu-me:
- Se você chega num curral de gado, você só encontra bosta de vaca. Touro não caga.
Vamos ao que interessa.
- Zé, que cara amarrada é essa? Perguntei-lhe já vestido de armadura e escudo levantado em posição de guarda.
- Você viu aí o aumento dos deputados? Uma sem-vergonhice. Pra aumentar o salário da canaiada falta dinheiro, agora pra eles... Nas eleições eles diziam: o povo é o nosso patrão. Deve eleger os melhores empregados para servir o povo. Aí os empregados que vocês botaram lá - não voto nessa canaiada - os senadores, os deputados, o diabo que o carregue, metem a mão no dinheiro do povo. O Brasil está doente. É um menino amarelo, empanzinado de vermes. Só vai com um purgante de óleo de carrapateira.
- Mas, Zé, se não é através do voto a limpeza ética, e então... Como vai ser meu velho amigo?
O Zé encara-me venta a venta. Verbaliza soletradamente, com cheiro de fumo mascado, a metáfora:
- Quando os Sísifos forem capazes de colocar a pirâmide de ponta–cabeça, talvez...
Preciso voltar rápido para casa, escarafunchar meus alfarrábios. Sísifos, pirâmide de ponta-cabeça, deixaram-me tonto.
- Zé, desamarre essa cara, provoco. Acompanhe-me numa lapada de cana com tira-gosto de torresmos nadando em farofa de farinha-dágua.