O AMOR EM TEMPOS DE INTERNET.

Por Carlos Sena



 

O amor nos tempos de Internet não se estabelece com a mesma riqueza como poderíamos esperar. Inicialmente temos a impressão de que o amor fique mais ao “alcance da mão” diante de tantas formas de comunicação, principalmente a internet. Num segundo momento, a gente começa a desconfiar; num terceiro, a certeza ronda nosso raciocínio com forte poder de assertiva. Isto posto, podemos inferir:       

a)   Amor se estabelece na confiança, enquanto via internet a impressão é de que o “jogo nas relações afetivas” tende a se legitimar;

b)  Grande partes dos parceiros (marido, mulher, etc.) de hoje têm no computador um “rival”. O que for mais hábil com a máquina leva mais vantagem, pois consegue esconder melhor atitudes infiéis;

c)   Involuntariamente se vive uma relação a três. O computador às vezes ganha a parada.

d)  Amar está ficando burocrático: redes sócias e senhas; recados, depoimentos, telefonemas com identificação de chamadas ou não; torpedos, twiter, e-mails, web can, login, comunidades, blogs, chat, home Pager, celular, edtc., e respectivas senhas e logins. No MSN a gente pode estar conectada pra todo mundo ver, apenas parcialmente ou invisível. Dito diferente: podemos ver a todos, mas todos não nos vêem. Nisto, o parceiro que estiver on line e não quiser ser visto pelo outro fica “solto da buraqueira”...

e)   Fica quase impossível não se descobrir se o namorado, marido, amante, vivem nas redes sociais. Mais que viver, relacionar-se afetiva e clandestinamente em romances paralelos imaginando que o “titular” nada sabe.

f)    As relações ficam trabalhosas, burocráticas e pouco emocionantes, pois parece que um clima permanente de desconfiança fica estabelecido subliminarmente;

g)  Institui-se, desta forma, a legitimação do amor irresponsável?

 

 

 

 

 

Independente do que se possam concluir, tudo indica que fechar essa questão delicada requer maturidade dos que se amam. É meio perversa como aquela outra questão que envolve os que “matam por amor”. Poderiam morrer por amor, mas não o fazem! Isto nos remete às dificuldades recorrentes de se estabelecer o amor na solidez da palavra dada como, em tese, teria que ser.

 

As redes sociais vieram pra não mais sair. Evidentemente que não as podemos culpar pelas mazelas humanas; pelas dificuldades que o homem moderno parece dispor para construção a dois do afeto, do amor, por que não dizer? Neste viés, podemos  elaborar uma breve teoria: as redes sociais reúnem pessoas, mas não as une. Neste sentido observa-se que a grande maioria dos namoros e casamentos continua se repetindo nas mesmas dificuldades. Houve pouca evolução na administração do ciúme, do controle, do estabelecimento de direitos iguais. As próprias discussões entre os parceiros continuam dentro do mesmo diapasão verbal e gramatical. Exemplo: diante de uma traição explícita, boa parte dos casais arma verdadeiros “barracos”, agridem e até matam, independente de classe social. Fica evidente que a inserção de tecnologias modernas, de utensílios domésticos que facilitam a vida, quase nada interfere nas nossas mudanças interiores. Repete-se um pouco da lógica geral do cientista que descobre uma tecnologia de ponta, mas é incapaz de perdoar o outro. Sua descoberta – produto da inteligência, pesquisa e intelectualidade, torna a vida mais prática. Contudo ele nem sempre consegue manter uma relação afetiva e profissional com seus colegas de maneira evoluída, ética.  

 

Outro fator que não podemos enfatizar: a solidão. Os homens modernos são muito mais solitários do que no passado. Dá-nos a impressão que um mundo com tantos meios e veículos de comunicação – cercado por infinitas redes de relacionamento, seria mais solidário. E o que se observa: discriminação contra minorias, xenofobia, homofobia, violência urbana – verdadeira cultura da intolerância e da falta de amor nas relações. Parece mesmo que estamos reunidos em função do mundo globalizado, mas unidos?! Unidos?

Retomando a relação a dois, temos a sensação de que estamos legitimando o errado no lugar do certo. O certo é o amor que não acontece sem a confiança. O errado é o “amor” que se deixa minar pelas redes sociais de relacionamentos. Entre o amor certo e o supostamente errado, um dos parceiros certamente sofrerá com a incidência de um sobre o outro.

O ser humano ainda não conseguiu, no seu trajeto evolutivo, estabelecer uma afetividade que seja capaz de administrar o amor sobre outros ângulos de visão e de ação. A idéia de posse que é muito freqüente nos que se amam, não evoluiu muito, independente do nível intelectual e de classe social. O ciúme, idem. Pra quem acredita, talvez carecesse de outra compreensão de natureza espiritista, mas que não convém nestas considerações. Talvez seja melhor admitirmos que a humanidade avançou pouco por dentro; que o amor que tanto buscamos lá fora fica mais difícil se a gente primeiro não se amar.  

Finalizando, acreditamos no amor e nas relações; acreditamos que o mal maior não esteja na internet nem nas redes sociais de relacionamentos. Estas não podem ser culpadas pelas nossas dificuldades interiores de ser feliz. Afinal, tanto a internet quando o que dela advém como as redes sociais de relacionamentos, foram pelos homens inventados. Quem se atreve a dizer que vive sem ela? Porém é preciso entendê-la no seu conjunto, pois a SOLIDÃO, por exemplo, não pode ser por ela vencida. Um fato: algumas pessoas têm em seu Orkut dezenas e centenas de pessoas adicionadas, mas pouquíssimas são as que verdadeiramente se relacionam. Muitas vezes sequer ligam no dia do aniversário, exceto aquelas mensagens “chapeadas” que pouco valor afetivo conduzem. E daí? “A solidão é fera, a solidão devora”, já dizia Alceu Valença na canção cuja letra segue  abaixo:

Solidão

Alceu Valença

A solidão é fera, a solidão devora.
É amiga das horas prima irmã do tempo,
E faz nossos relógios caminharem lentos,
Causando um descompasso no meu coração.

A solidão é fera, a solidão devora.
É amiga das horas prima irmã do tempo,
E faz nossos relógios caminharem lentos,
Causando um descompasso no meu coração.

A solidão é fera,
É amiga das horas,
É prima-irmã do tempo,
E faz nossos relógios caminharem lentos
Causando um descompasso no meu coração.

A solidão dos astros;
A solidão da lua;
A solidão da noite;
A solidão da rua.

A solidão é fera, a solidão devora.
É amiga das horas prima irmã do tempo,
E faz nossos relógios caminharem lentos,
Causando um descompasso no meu coração.

A solidão é fera,
É amiga das horas,
É prima-irmã do tempo,
E faz nossos relógios caminharem lentos
Causando um descompasso no meu coração.

A solidão dos astros;
A solidão da lua;
A solidão da noite;
A solidão da rua.

 

 

Hoje é sábado. Não um sábado comum, pois que é dezembro. Lá fora as pessoas estão reunidas para uma confraternização que eu irei participar. Eu não conheço ninguém, pois sou novato no condomínio. Contudo, ainda demorarei um pouco, pois vou atualizar meu Orkut, meu Facebook, meu e-mail e, por último, o Badoo. “Dá pa tu?”... Só pra não perder a rima.