Amordaçando as rotativas ou lacrando os monitores
Amordaçando as rotativas ou lacrando os monitores
Periodicamente os brasileiros afirmam que vivemos numa democracia, depois de concluída uma fase de autoritarismo. Por democracia entendem a existência de eleições, de partidos políticos e da divisão republicana dos três poderes, além da liberdade de pensamento e de expressão... essa visão é cega para algo profundo na sociedade brasileira: o autoritarismo social. Nossa sociedade é autoritária porque é hierárquica, pois divide as pessoas, em qualquer circunstância, em inferiores, que devem obedecer, e, superiores, que devem mandar. Não há percepção nem prática da igualdade como um direito. Nossa sociedade é autoritária porque é violenta: nela vigoram racismo, machismo, discriminação religiosa e de classe social, desigualdades econômicas das maiores do mundo, exclusões culturais e políticas” ( página 435, Convite à Filosofia. Editora Ática, São Paulo, 2002).
Refletindo sobre a diferença entre linha editorial e linha comercial, como prático de jornalista de jornal do interior, que já experimentei nessa minha vida, vieram-me algumas considerações, de muitos matizes, a partir da liberdade de imprensa.
O primeiro ponto tem a ver com coerência ética.
Coerência ética é uma regra geral em que toda ética se apóia em alguma medida. Assim, se uma pessoa tem certos valores e age de acordo com eles, está sendo eticamente coerente, porque existe coerência entre as ações dessa pessoa e aquilo que ela valoriza como um bem. No entanto, se ela age contra seus próprios valores, ou seja, ela acha que não deveria agir de uma certa maneira, porque reprova esse modo de agir, e mesmo assim age. Aí, não está havendo coerência entre seus valores morais e seu modo de agir.
O segundo ponto toca na isonomia e no princípio da igualdade, dentro de um contexto de perseguição ideológica, preconizando a igualdade entre os sujeitos perante o ordenamento jurídico, como supedâneo no artigo 5º da Constituição Federal.
O terceiro aspecto diz respeito à aplicação dos princípios constitucionais ao direito privado. Ou seja, a aplicação das garantias fundamentais mesmo às relações estritamente privadas.
Desse modo, no âmbito negocial, o respeito às garantias fundamentais é condição de validade do próprio ajuste comercial. Em última análise, passamos a compreender o sentido da norma civil a partir das diretrizes estabelecidas pela Constituição.
O quarto ponto dessa conversa resvala no artigo 422 do Código Civil, o qual veicula o chamado princípio da boa-fé objetiva. Trata-se da necessidade de ambas as partes contratantes adotarem um padrão de comportamento ético, oxigenado pelas virtudes da honestidade, transparência, de modo a respeitar as legitimas expectativas da outra parte no negocio jurídico.
A boa-fé é um dos elementos caracterizadores do abuso do direito. Desse modo, o ato violador da boa-fé caracterizará um ato ilícito.
Finalmente, o quinto e último ponto desse cavaco diz respeito à liberdade de imprensa, ante o direito constitucional à informação, mais como bem da sociedade, menos como conjunto de direitos corporativos das pessoas ligadas a essa atividade. Garante a vigilância permanente e o firme posicionamento diante de fatos que representam atentados à ordem jurídica vigente e aos princípios éticos.
Está a perigo por várias razões em nossa sociedade mundial .
E nessa toada, dentro de um paradigma mais estrito, até que ponto é justificável estancar a veia jornalística, afeita à realidade vislumbrada, coerente a uma linha editorial ética, porém dura, por motivos outros que não comerciais ?