Saudade

Hoje bateu novamente aquela saudade. Num tempo de anos passados, revejo o mesmo filme. Casa aberta, cheia de sons, cores, odores, cheia de amores. Éramos uma família. Assim como todas as outras, nem mais nem menos conflitos, surpresas, risos, conquistas e perdas. Mas, o que me teima na mente é aquela rotina que não vivencio mais. Pelo menos não daquele jeito. Lembro do amanhecer, dos rostos sonolentos no café da manhã. Cada café ao gosto de cada um. Depois a partida para a vida lá fora, acompanhada de minha oração pela proteção. Morar em cidade grande é complicado. A manhã passava voando, muitas vezes ao som do rádio, do chiado da panela de pressão, do cheiro bom de comida preparada com amor.Camas arrumadas, travesseiros ao sol. Dá uma saudade danada. O tempo passou voando. Meninas viraram mulheres. Lindas, cheias de sonhos, projetos. A primeira alçou asas. Foi morar na capital. Guerreira, batalhou. Conquistou seu grande amor. Casou, gerou. Um neto lindo me deu. E a vida continuou. Aí, nova partida. Mas, dessa vez, com sofrimento. Meu companheiro fez a viagem para a eternidade. Ficamos nós duas. Minha filha caçula e eu. Mulheres, companheiras, cúmplices, mãe e filha. Solitárias, mas guerreiras. Decidimos, também, alçar nossos vôos. A rotina antiga não se sustentava mais. Mudei de casa. Meu novo recanto pouco tem daquele passado. Minha filha há tempos vive com o companheiro. Também batalha, faz projetos. Mas de uma maneira amadurecida, com novos olhares e desejos. Tenho minha profissão que amo. E a aposentadoria está chegando. Em momentos como hoje, paro e penso. Folheio o livro do passado e tento reencontrar aquela que um dia fui. Também estou muito mudada. Antes, vivia para nós. Os planos eram nossos. Hoje, cada uma tem seus planos, suas vidas. Mas, o final de mais um ano está chegando. E aí virá um pouco daquele tempo. A ceia( mãe: "faz creme de milho? tronco de nozes? farofa doce"?) o ritual de presentes. O brilho em nossos olhares. E em silêncio, tenho certeza nos recordamos, nos unimos ainda mais. Unidas naquele tempo que desperta em sons, odores, olhares cúmplices, sonhos e amores. Daquele tempo que renasce e que é só nosso. Para sempre.

Nuria Monfort
Enviado por Nuria Monfort em 08/12/2010
Reeditado em 10/01/2013
Código do texto: T2660308
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