Tirando onda com os infortúnios

Renato é sobrinho de uma amiga. Uma amiga bem grudadinha na minha família. Minha mãe diz que ela é filha postiça e ela a chama de mama. Seu nome é Sofia. Sofia é gente boa e seu sobrinho Renato tem minha admiração por vários motivos. Primeiro porque ele é novinho, vinte anos, mas tem papo de gente grande e segundo, pelo modo como lida com as coisas. Convém resumir a história de Renato. Quando ele tinha dez anos jogava bola com os amigos num campinho perto de sua casa. Alguma confusão de bandidos que trocavam tiros ocorreu próximo a esse campo de futebol. Uma das balas alojou-se na coluna de Renato. De lá pra cá ele não andou mais. Teve que ausentar-se de suas atividades de criança por um bom tempo e ficou internado outro tanto retornando à escola mais ou menos seis meses depois. Foram necessárias muitas adaptações por parte dele e da família para lidar com a nova situação. Mas o que admiro é que não fazem disso lamento. Renato é amado e ama a vida. Ontem fui ao aniversário de comemoração de meio século do noivo da tia dele, a Sofia. Cheguei tarde (pra variar) e uma fome de leão tomou meu estômago. Sofia, atenciosa, fez um prato pra mim e comecei a conversar com Renato. Perguntei do novo negócio que ele abriu e em seguida das namoradas. Aliás, namorada é o que não lhe falta. Todas bonitas, carinhosas, e ciumentas segundo ele. Como não aguenta marcação cerrada, ele diz que termina logo. Não quer ninguém controlando-o. Ele seguiu falando da penúltima namorada que teve, o que fez lembrar-se de um episódio cômico que viveram numa viagem à Ubatuba. Conta Renato que chegou à praia e resolveu surfar. (Renato faz tudo o que pessoas que andam faz: trabalha, namora, estuda, surfa, até pichação em muro já fez e também apanhou da polícia por isso). Prossigamos ao episódio na praia. Alugou a prancha, deitou-se sobre ela e entregou-se ao mar. Furiosas que estavam as águas arrancaram-lhe a sunga e ele não percebeu. Continuou em sua prancha entregue as violentas e divertidas águas do oceano. Viu que de longe a namorada acenava para ele, o que fez ele imaginar que ela queria entrar na água também. E respondia: “Pode vir, pode vir”. E ela acenando, acenando. De repente um dos rapazes que estava próximo a ele tirou do mar uma sunga e perguntou: “É de alguém?” Renato reconheceu a vestimenta de imediato e abaixou os olhos para suas partes íntimas. "Ohhhh, estavam desnudas!" Pegou a sunga e tentou colocá-la. Imagina se consegui? Não. Toda vez que se ajeitava para vesti-la, vinham as ondas e viravam tudo: Renato e sua sunga. A namorada finalmente chegou para ajudá-lo. Nervosa que estava colocou a sunga do lado errado. A parte que era da frente ficou atrás e a parte de trás ficou na frente. Segundo Renato não adiantou nada ela tê-lo vestido, ele continuava com parte de suas partes pra fora. Eu ouvia aquilo e não sabia se ria ou se chorava. Mas achei curioso. Não por nada, mas pela naturalidade com ele relatava as coisas. Me fez pensar sobre o que a gente faz com as coisas que nos acontecem. Que rumo damos a elas. Entre brincalhona e um tanto maquiavélica fiz o favor de deixá-lo um pouco preocupado. “- Renato, pensa se alguém tirou fotos ou filmou? Imagine você acessando You Tube e se vir lá todo atrapalhado tentando colocar a sunga?” Aí com um jeito de pensando ele disse: “Ia ser uma comédia!” Ou seja, tá preocupado não. Parece que ele tira um trofeuzinho do bolso cada vez que supera os obstáculos que a vida lhe impõe.

Isabel Cristina Rodrigues
Enviado por Isabel Cristina Rodrigues em 06/12/2010
Reeditado em 26/07/2011
Código do texto: T2656266