AMOR & TRAIÇÃO

Soneto de Fidelidade

Vinícius de Moraes

”De tudo ao meu amor serei atento

Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto

Que mesmo em face do maior encanto

Dele se encante mais meu pensamento.

(...)”

O sentimento romântico de posse do outro(a), leva o ser humano a crer que aquela criatura amada nunca vai se interessar por outra pessoa, que os seus olhos nunca vão pousar sobre as formas de outro corpo com desejo e paixão, que seu coração nunca vai palpitar em sobressalto pela juventude e frescor de uma ninfeta ou de um belo rapaz ou pelo carinho, atenção e maturidade de uma mulher ou de um homem mais maduro e experiente...

E mais, acredita-se que a pessoa amada tem a obrigação de ser fiel, portanto, não é necessário “tratar” abertamente esse tema tão real na atualidade e tão antigo no seio da família.

A ilusão de que isso nunca vai acontecer “comigo” elimina o medo e anestesia o relacionamento, desenvolve-se assim um campo de conforto onde impera a certeza de que o rumo do relacionamento depende única e exclusivamente do outro e onde a rotina vai minando aos poucos as chances de evitar a destruição do amor entre os pares.

Porém o que se vê, no entanto são relacionamentos, até mesmo, em alguns casos, de longos anos de convivência, desmoronando mediante a aparição de um terceiro elemento - o(a) amante.

Como se afirma no título da peça teatral de Miguel Falabela – “Trair e coçar é só começar”, mas a traição, olhando sob uma óptica mais ampla, não se define apenas em o fato de o esposo, a esposa, namorado, namorada estabelecer um contato emocional e/ou físico com alguém que se inclui entre eles. A traição começa no café da manhã quando não se deseja mais sequer um bom dia para o ente querido, quando o beijo de despedidas no portão entra em desuso, quando se esquece de reconquistar cotidianamente a mesma pessoa em eterna novidade.

A comichão, a coceira é sintoma de uma alergia, de uma intoxicação, não é a causa, mas o efeito de um problema silencioso que explode na pele, na respiração, no corpo enfim.

Assim é também a traição, ela não é a causa, mas efeito de pequenos desastres cotidianos que não são levados em relevância, uma vez que aquela pessoa que está ao lado já é de posse de quem a ama, e que quem ama, o possuidor, não imagina que de repente pode acontecer de alguém aparecer e levar o objeto de sua posse.

É necessário enxergar as pequenas tragédias do dia a dia, e dessa forma, evitar a tragédia maior, que se resume não na separação, mas na dor fremente da perda de quem se ama, na solidão visceral de se perder do outro no percurso de uma caminhada à dois. “Não é bom que o homem viva só” e a solidão é fruto podre da traição, porque quando o homem (diga-se homem no sentido de humanidade) trai aquele(a) a quem supostamente ama, na verdade, está traindo a si mesmo(a), uma vez que junto a pessoa amada forma uma só carne.

Nina Costa
Enviado por Nina Costa em 03/12/2010
Reeditado em 16/04/2022
Código do texto: T2652013
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