SE É A BISA EU TOU FERRADO!...

Tomás, meu neto caçula (5 anos), um dos meus personagens favoritos, veio almoçar conosco e passar a tarde, a pedido dos pais, Daniel e Karina, sempre absorvidos pela excessiva carga de trabalho nos hospitais, face aos plantões da vida.

Às vezes a Irene, tia da minha mulher, vem almoçar conosco aos domingos e, solteirona cheia das manias, vive implicando com os modos do menino, chamando-lhe a atenção por qualquer coisinha. O Tomás fica aborrecido e eu mais ainda, pois ela nunca foi mãe e, portanto, carece de tarimba nessa área. Coisas da velhice dela! ... O “Bafo de Bode”, personagem do Jorge Amado em “Tieta do Agreste”, é quem poderia muito bem explicar a incompetência da Irene para criticar o Tomás. Não posso falar aqui, pois o “Bafo de Bode” diz coisas impublicáveis. Leiam o livro ou o trecho da discussão dele, bêbado contumaz, com a Dona Carmosina (Chefe dos Correios), solteirona empedernida, numa reunião de pais e mestres sobre as crianças da escolinha local, em Santana do Agreste.

Eu mesmo, então, fui buscá-lo no colégio e o lourinho sapeca chegou sujo e suado, não sei se de tanta atividade curricular ou em função das brincadeiras com os seus amiguinhos de classe. Passei com ele antes no salão ao lado do prédio e o Pedrinho, seu barbeiro, cortou-lhe as belas madeixas, fazendo um corte moderno e mais apropriado ao seu visual de estudante espevitado.

Aparada sua juba dourada, ele adentrou o nosso apartamento todo faceiro e a Vovó Mari logo avisou:-

“- Tomás, vamos já tomar um banho caprichado e trocar de roupa, tá? Em seguida você vai almoçar pra depois ver um DVD com os seus bichinhos, desenhar e brincar com o seu Vovô Bebeto, viu?”

De banho tomado, cabelo cortado e penteado, roupa limpa e cheirosa, o lourinho se acomodou no sofá da sala e pediu pra ligar a TV no tal “Cartoon Network”, sua mais recente atração.

Sua avó chegou com seu prato feito, sentou ao seu lado e principiou a dar-lhe a comida na boca. O Tomás, com as pernas esticadas na sua direção, comia e acompanhava as peripécias exibidas no “Cartoon”. Deixei os dois na sala e dirigi-me ao escritório, ligando o computador e buscando o “RDL”, naturalmente, a fim de checar a minha escrivaninha e conferir as novidades junto aos meus amigos virtuais.

Foi quando ouvi, lá do escritório, um grito assustado da Vovó Mari com o netinho, que pela sua entonação já dizia tudo:-

“- Tomás, olha só o que você fez!!! ... Olha só, Tomás!!! ...”

Corri lá e constatei aborrecido:- o garoto, com o sentido na televisão, foi mudar de posição, recolheu uma perna e deu, sem querer, um bico no prato de comida. Voou arroz, feijão, carne moída (ele adora) e salada pra todo lado, emporcalhando o sofá e o piso, provocando insatisfação à minha pobre mulher. E o moleque, constrangido:-

“- Ô vovó, desculpa, vai! Foi sem querer ... Você desculpa, vovó, desculpa, tá?”

Aí eu, chateado também mas dando uma de “bombeiro”, falei:-

“- Puxa, Maria Mari, mas você mesma não disse que o garoto veria DVD após o almoço? Por que cismou de lhe dar comida vendo TV? Só podia dar nisso, minha filha! Agora é ter paciência e limpar a sujeira ...”

Algum tempo depois, no escritório, enquanto o Tomás já recostado nos travesseiros via o tal DVD, eu aproveitei e lhe disse:-

“- Puxa, Tomás, que lambança você fez na sala, heim? Já pensou se o seu pai ou a sua mãe vissem? Com certeza você levaria alguma bronca dos dois, né? ...”

Foi aí que o esperto lourinho dirigiu-me aquele olhar penetrante, assim meio de lado, na sua pose predileta e arrematou:-

“- Ô vô, já pensou se fosse a “Bisa” Irene? Eu tava era ferraaado! ...”

-o-o-o-o-o-

B.Hte., 02/12/10

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 02/12/2010
Reeditado em 20/01/2011
Código do texto: T2650017
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