O TIROTEIO

"Em qualquer comunidade civilizada, cada homem ou mulher tem escondido no seu âmago uma história criminosa" EDGAR WALLACE

Como diria o nobre Gilberto Gil: “o Rio de Janeiro continua lindo [...]”. Será? A perseguição policial aos bandidos favelados dos morros está a tona. O Jornal Nacional mais parece um filme policial de quinta categoria da sessão da tarde. O Rio está uma mistura de Bolívia com Oriente Médio: uma combinação vadia de cocaína com armas.

Sim, tudo bem, eu concordo plenamente com a operação policial lá. Concordo com a prisão dos bandidos e com a matança daqueles elementos. Agora, mocinhos, vocês aí que ficam lendo noticiários nos jornais e telejornais, só chacoteando o que tá acontecendo, aplaudindo a polícia e esculachando os bandidos, permanecem de braços cruzados tomando sopa às oito da noite e arrotando coca-cola. Perfeitamente... lugar de bandido é na prisão, como diz o jargão popular. Só não esqueçam que aqueles bandidos filhos da puta, são um problema nosso. A política infra-estrutural é uma negação. O corpo jurídico punitivo, uma balela. Nós, a sociedade civil, um monte de merdinhas, que, basta um emprego e a estabilidade financeira, seja de que modo for, pra se contentar com meros sábados de bebedeiras e domingos de praia, esquecemos de pedir e cobrar, de fazer e punir, de exigir e executar. Todos nós: eu, você e o governo, viramos as costas àquele bando de marginais, pra depois nos queixarmos deles quando nos põem a arma na cabeça e gritam: MÃOS AO ALTO. Nós, que discutimos picuinhas em ano eleitoral, mas não cobramos dos políticos nada de efetivo, queremos exterminar a favelada total. Tenha santa paciência! Ou melhor: tenha, a santa, paciência.

E mais, não pense você que a polícia será a salvadora da pátria. Ela poderá matar esses caras ou prendê-los, que mesmo assim, da forma que está, outros virão e os que forem presos, comandarão da própria cadeia o tráfico e as armas. O problema é estrutural. Integramos um governo e somos culpados por esse governo sem percebermos que somos. De que adianta prender um bandido, se o carcereiro que tem o dever de mantê-lo preso ganha “mil conto” por mês, bem menos que qualquer boqueiro meia tigela de corredor penitenciário? Não é, nem nunca foi a cadeia o motor social de inclusão ou exclusão social. Bandido tem que ser preso? Tem. Tem que morrer na luta travada contra a polícia? Tem. Mas pra isso, nosso corpo político, jurídico e social, deve estar muito mais bem “armado” que a polícia. Como diria chorão, vocalista do Charlie Brown Jr. “menor bolado por aí tem de montão, morre um, nasce um monte com a maior disposição”. E antes que venha uns ignorantes preconceituosos dizendo: lá vem esses sociologozinhos de merda falando merda e citando banda de vagabundo”. Chico Buarque, um dos magos da nossa cultura, um dos mestres da Bossa Nova, cantou:

“chame, chame, chame lá chame, chame o ladrão, chame o ladrão...chame o ladrão”. Espera, o jargão não é “chame a polícia, chame a polícia”, não??

Excelente o papel da polícia. Acho perfeito a sua função. Tenho excelentes amigos e parentes policiais. Mas a policia não é a solução de um problema tão enorme. Vocês não podem achar que a polícia será o freio que fará parar a criminalidade. Edson Gomes também cantou: “olha, a polícia, ela não é a solução não [...] as vezes, a polícia entra no jogo”. Não adianta nada, tá, galerinha ociosa de plantão, prender esses bandidos do narcotráfico pra depois ter que puni-los de forma “falida”, como dizia Beccaria. Não adianta matá-los hoje, se as crianças da favela, como diria John Rawls , não têm a “liberdade igual de oportunidades” de ser, como tem o garoto do condomínio de luxo. Não adianta. Eles crescerão, e mais tráfico, mais assaltos, mais morte e perseguições haverá no futuro. O problema é muito maior do que os seus olhos são capazes de enxergar.

Caso se pegasse os bandidos da favela e os pusessem em Brasília, bem como se pegasse os políticos de Brasília e os pusessem nas favelas... seria trocar o seis por meia dúzia. Mas vai que tu me questionas com aquele arzinho de hipócrita ocioso: “ei, meu filho, mas nem todo político é corrupto”. Beleza. Concordo. Mas também nem todo favelado é traficante. Pior, proporcionalmente isso se agrava mais. Ou seja, menos de 1% da população da sociedade civil é bandida; Já mais de 50 % da sociedade política, se envolveu com corrupção. Significando dizer que, é tão bandida quanto? Não, não... é bem pior! Ou seja, cada milhão de reais que o corrupto filho da puta “rouba” pra fazer sua mansão de luxo, serviria pra fazer uma escola pra mais de um mil favelados.

Faz o seguinte pô, quando acabar a operação nas favelas cariocas, peça encarecidamente ao BOPE e às forças armadas que sigam à Brasília, fechem o espaço aéreo e terrestre da praça dos três poderes em Brasília, exterminando assim o palácio do planalto e o congresso nacional... ah, foi mal, deveriam vir escritos com letras maiúsculas, mas esquece, não merecem. Dessa forma, a limpeza seria geral. E agora, já sem os políticos corruptos e os traficantes dos morros, estabeleceríamos outro governo conosco no poder. Mas aí pergunto: estamos preparados?

As coisas como estão, sabes tu qual a diferença entre um partido político e uma facção criminosa. Não? Nem eu. São tão idênticos que me perco no espelho que reflete suas aparências semelhantes.