22. Coliseu
Levei duas horas ou mais quando poderia ter levado apenas uns vinte minutos, mas não quis. Gosto de ir saboreando o caminho, de ir, entretanto, escrevendo enquanto ando, ora em pé, ora sentado na berma ou encostado a um muro ou a um caixote de lixo.
A escrita liberta-me. Pode não valer uma casca de caracol ressequida, mas para mim serve de catarse Uma espécie de oração laica que me vá arrumando o desarrumo da cabeça.
E adoro fazer isso da maneira que o faço.
Se pudesse, mas não posso, fazia isso para o resto da minha vida. Vou ver entretanto se posso fazer um pouco disso.
Ao menos, mais vezes.
Estou a soltar dentro de mim demónios e anjos, o calor aperta, e tudo acontece na via dei Fori Imperiali em Roma. Nada de grave. Sinto-me bem.
Não faço mal a ninguém, nem sequer faço mal a mim mesmo.
É sábado. Tocam muitos sinos de mais do que uma igreja. Não sei quantas.
Que se passará? Não sei, nem sequer leio o jornal, nem vejo tão-pouco a televisão ou oiço a rádio.
Passo pelos monumentos sem pachorra nenhuma para os ver com olhos de ver. Deixo que a história deles me impregne a roupa como o fumo impregna a roupa de quem está perto de um fumador.
Falta-me pachorra. Escrevo agora apoiado num caixote de lixo do passeio.
Roma, 10 de Julho de 2010