Em Brasília 19:00 hs.

Tem sido comum quando abrimos os jornais e revistas ou assistirmos à cobertura da imprensa televisiva sobre escândalos políticos das mais diversas qualidades – e nisso nossos representantes são incrivelmente imaginativos – ouvirmos que esses acontecimentos possuem uma dimensão positiva que diz respeito ao fortalecimento e amadurecimento de nossas estruturas democráticas.

“Mensaleiros”; “Sanguessugas”; “-dutos” com nomes próprios e outros neologismos que são inventados ou reforçados pela grande imprensa, num espetáculo de criatividade sensacionalista e no mais das vezes “fiteiro” e estéreo. Lobistas financiando gastos pessoais de senadores; secretárias e amantes transformadas em objeto de desejo e sempre prontas a mostrar muito mais do que provas de acusação em revistas masculinas (provavelmente com direito à photoshop e outras maravilhas da tecnologia moderna, mas não precisamos de um CPI para apurar isso, até porque por vezes o resultado não é dos piores), talvez seja a faceta mais tragicômica e surreal de como nós tratamos nossas mazelas políticas.

E a democracia? Numa República que começou e continuou com sucessivos golpes militares; com vários mecanismos de coerção e perdas para sustentar o voto obrigatório; votações secretas de parlamentares que deveriam tornar público seu compromisso com os eleitores e terem coragem de mostrar suas ações políticas; trocas de legenda com a facilidade de quem usaria uma gravata ou terno novo (claro que o generoso “auxílio paletó” esta aí para isso); governabilidade e aprovação de leis pelo legislativo trocadas por cargos, ministérios, direções em estatais (das que sobraram, é claro) e mesmo dinheiro, nos mostra que nossas estruturas e instituições pretensamente democráticas estão viciadas na base e que uma reforma, que não deixaria de ser inclusive moral, torna-se cada vez mais urgente.

E nosso amadurecimento? Os resultados das últimas eleições já falariam por si só! Em campanhas nas quais candidatos são apresentados com as mesmas estratégias de marketing de refrigerantes e biscoitos; o velho ranço populista da média no boteco e do beijo na pobre velhinha sem dentadura continua atualíssimo (o que essa gente não faz quando vai à Pelotas pedir votos?); o excessivo personalismo que nos impele a votar numa pessoa “bem preparada” ou “bem intencionada” sem indagar qual é a sua filiação partidária, são provas mais que cabais de precisamos repensar nossas certezas como eleitores, que votar ainda é um exercício ingênuo de “fé” e que talvez falcatruas e escândalos políticos não amadureçam nossa capacidade de escolher melhor nossos representantes, posto que pela quantidade deles já deveríamos estar devidamente vacinados contra determinados políticos que continuam contemplados com novos mandatos.

Fracassamos como povo quando votamos em candidatos que baseiam sua campanha na super-exploração da imagem, por vezes com direito a exaltação da jovialidade, beleza física (será?) e manobras radicais em jet-ski ou na exibição de um currículo acadêmico impecável (mesmo que depois sejamos convidados a esquecer tudo que fora escrito em “outros tempos”); quando fazemos de nosso voto o mais vil objeto de barganha e o vendemos por qualquer preço ou promessa, mesmo dando o devido desconto de que em um país tão desigual e com tão poucas chances reais de uma parte significativa da população mudar de vida há um convite muito tentador ao clientelismo.

Até quando iremos reeditar a frase de Lima Barreto que apesar de escrita há décadas e “repúblicas” atrás possui ainda triste viço e atualidade: “O Brasil não tem povo, tem público”?

Dé Garfield
Enviado por Dé Garfield em 26/11/2010
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