Trifetas - não era pra ser.
Seu Jordão, velho escritor há muito aposentado, por vicio escreve todos os dias duas crônicas. A primeira começa sempre da mesma maneira: descreve o tempo, e uma letra qualquer escrita após a descrição das nuvens, é suficiente para fazê-lo lembrar de um fato ou inventar um drama.
Crônica pronta, o homem abre o jornal e após ler e grifar o que mais lhe atrai, normalmente os páreos do Jóckey, o escritor cochila deitado na sua cadeira de vime, tendo o gato aos seus pés.
Ao acordar escreve a segunda crônica, que é feita de sonho e realidade. Depois, telefona para Jorge, seu amigo de longa data, em quem confia cegamente inclusive para fazer as suas apostas e eventualmente receber os seus prêmios.
E foi ao redigir a segunda crônica que seu Jordão teve um enfarto. Acudido prontamente, sobreviveu e pouco a pouco, se recuperou totalmente.
Um dia a sua esposa lhe disse: - Jordão, no dia que você teve o enfarto, você deixou algo escrito e por mais que eu leia não consigo saber se é crônica ou bilhete de amor.
Seu Jordão passou os olhos pelo pequeno bloco de papel pardo e percebeu que havia começado uma crônica, e depois escrito os nomes de suas duas éguas preferidas para apostar na trifeta. O velho escritor passou o dia pensando no resultado daqueles páreos.
No final da tarde, não se conteve mais e ligou para Jorge; e foi com o telefone na mão que teve o segundo e fulminante infarto.
No velório a viúva ficou sabendo que o marido teria finalmente acertado duas trifetas simples, no dia do primeiro enfarto, prêmio que passou a vida perseguindo, mas que não teve tempo de fazer a aposta.