MEU JARDIM DA INFÂNCIA
Val-Larbacky

Na lembrança, a distância longe vai. No tempo, no espaço. Nas orquídeas... A floresta até então virgem do menino o viu entrar e sair e tomar as leiras do cafezal e descer a íngreme encosta verde. Lá embaixo o cristalino córrego e sua horta contemplada. O passeio entre pés de couve e acelga e chicória e almeirão e alface e gergelim e mostarda... O fresco e verde aroma da sua infância — hoje sei, pura e feliz — Inocente.
Logo estava ele, feito mãe-árvore enfeitada com parasitas — belas orquídeas de variadas formas e cores —, a adentrar o terreiro de casa. Parte mais íntima da gleba com cheiro de verde e de terra molhada onde galinhas, galinholas, perus, patos, paturis e marrecos davam o tom da harmonia entre cães e gatos e cabras...
“Menino, leva de volta essas parasitas”. Alertava sua avó. “Fora da mata, elas são atraso de vida e não podem ficar em volta da casa. Cuidado com o Caipora! Se ele descobre, fica zangado.”
A casa simples com as portas e janelas abertas para o mundo estendia-se além dos topos das montanhas e morros e colinas e vales e brejais infinitos. Morada de piaçocas e saracuras e quero-queros... O mundo era o quintal, mas cerca não havia. Somente o horizonte no mar de matas como janela da imaginação infantil.
No terreiro cercado de aromas e cores das manhãs estavam eles, os lírios... açucenas e copos de leite a esperar o menino sentar-se diante da touceira a apreciar o perfumado desabrochar de tão sublime expressão de vida. E os brincos-de-princesa e mirabilis jalapa — brancas, rosadas e as matizadas de belas nuanças —, espiavam em comunhão e silêncio o menino maravilhado.
Tudo, tudo ficou para trás. Agora era espiar pela janela de concreto, madeira e vidro os carros no ir e vir enfileirados, feito plantação de café, na larga avenida com nome de ex-presidente... Que incentivou a substituição do cafezal de sua infância por pasto de criar boi.
Agora — passarinho preso — era só espiar do 12º andar a muralha de altos edifícios que terminavam cercando a grande igreja, que poderia abrigar várias igrejinhas como as de São José, São Luís, Santa Luzia...
Olhando a Candelária, vinha à sua lembrança outras igrejas lá do interior: Nossa Senhora da Penha, Santa Maria, Santo Eduardo, São Luís Gonzaga... Onde seus quinze anos foram tatuados com estas e outras marcas.

Val Larbacky
Enviado por Val Larbacky em 23/11/2010
Reeditado em 10/10/2023
Código do texto: T2631830
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.