“Pavão”.
 
Por força da profissão, morávamos na capital do País.
Faço questão de avisar que não temos nada a ver com política Graças a Deus.
Praticamente forçada a freqüentar recepções mesmo não gostando não podia declinar dos convites...
Era uma chatice, uma mesmice! Raramente eram divertidos.
Estava levando minha vidinha tranquilamente quando recebemos um convite para jantar com o presidente, o vice-presidente e o relações publicas da companhia  e algumas autoridades convidadas.
Acostumada a esse tipo de convite e de encontros não me preocupei. Conhecia a muito tempo a todos com os quais ele trabalhava, gostava deles, eram muito agradáveis.
Mal sabia eu o que me esperava!
Fomos para o jantar...
Tenho coceiras, alergia, rinite, quando encontro gente de nariz “empinado”, gente que “se acha”...
Tem coisa mais enjoada e abusada que uma pessoa exibida? Duvido.
E duas então... É dose!
Pois bem nesse jantar tive o desprazer de ser apresentada a  um homem que era campeão mundial  na arte de se pavonear,por sinal seu apelido era “Pavão”.
Tenho  dó do pavão ave, tão lindo, coitado não tem culpa de nada!
Ele ocupava um cargo muito importante no governo, ninguém ousava demonstrar que conhecia seu apelido, mas Brasília inteira sabia.
Mais feio que a fome o homem era a empáfia em pessoa, feio e metido a besta! Uma combinação infernal!
Na recepção fiquei conhecendo a “figura” e excelentíssima consorte (ou com azar), ela parecia ter engolido o mundo inteiro, e ele definitivamente ficou entalado na sua barriga. Cara de “Maria vai com as outras”, mas com posse de falsa rainha parecia um peso morto sendo arrastada pelo marido!
Enfim um casal de amargar...
Logo no primeiro contato, ao estender a mão para cumprimentá-los olhei bem firme nos olhos dele e não gostei do que vi.
Acredito que a antipatia foi mutua, ele me olhou atravessado, parece que previa o que iria acontecer... Pensei com meus botões “se cuida mané”!
Para meu azar era um jantar quase íntimo, poucas pessoas, apenas seis casais à mesa.
Adivinha.
Ambos sentaram bem na minha frente!Tinha que ser, nosso destino estava selado!
Suspirei...
É hoje...
Esse jantar não vai “prestar”...
Ai, ai,ai, vou ter que me policiar, fechar essa minha boca enorme que demonstra ter vida própria, porque fala cada coisa, me mete em cada enrascada que só por Deus...!
Espero que não conversem comigo... Anjinho de Guarda me ajude...
Não adiantou. Parece que eu tenho o dom de atrair encrencas, mas hoje tenho que me segurar porque os outros convidados são pessoas importantes, gente que decide o futuro profissional de meu marido!
Ele que me conhece muito bem, me olhou desconfiado...
Um dos casais era super simpático, o marido tinha cargo importantíssimo no governo tão ou mais importante que o do “Pavão”, a esposa a quem chamarei de Isaura era muito agradável, parecia o tipo de pessoa que seria ótima amiga.
Como se diz “nossos santos combinaram imediatamente” ambos demonstravam estar de bem com a vida.
Sentaram ao meu lado, agradeci aos céus.
Tudo estava correndo as mil maravilhas quando resolvi comentar com a Isaura sobre o premio pago pelas loterias, pois envolvia muito dinheiro, era necessário ter muita sorte para acertar os números sorteados.
Pra que fui falar!!!!!!!!!!!!!!.
Eita boquinha danada, não podia ficar fechada?Eu deveria entrar muda e sair calada!
O “Pavão” na minha frente não perdeu a chance, pegou a deixa no ar e levantando o nariz pernosticamente com expressão irônica me perguntou:
-A senhora costuma jogar na loteria?
Sabe aquele ar de desprezo que diz claramente que você é ralé! Engoli em seco e educadamente (ainda) respondi que sim, mas que não tinha esperanças de ganhar.
Aí o caldo entornou...
Ele deu um sorriso cínico mais falso que nota de duzentos e olhando em volta para se certificar que todos estariam ouvindo disse:
-Meu motorista e meus empregados também jogam! Coitados!
Aquele coitados entrou na minha alma!
Zuniu nos meus ouvidos e parafusou no meu “cerebrinho loiro”.
Meu sangue começou a ferver e subir desde as solas dos pés até meus  olhos.Vi  tudo através de uma nuvem vermelha!
Queria matar “aquela coisa” exibida! Que ódio!Se olhar matasse, ele seria imediatamente fulminado.
Ahhh, bandido, querendo se fazer de importante as minhas custas? Espera aí que você já sossega.
Não me segurei. Não contei até três. Não pensei. Explodi de vez!
Mandei a resposta como se diz na “bucha” e seja o que Deus quiser!
Respondi com a voz mais tranqüila e suave que consegui inventar na hora:
-Sabe por que eles jogam? Porque não são custeados em seus luxos com o nosso dinheiro! Esses que o senhor chama de coitados precisam trabalhar para ter uma droga de salário para servir quem recebe uma fortuna para não fazer nada, com o dinheiro que eles e nós pagamos. Quem se considera muito importante deveria pensar um pouco sobre isso, o Senhor não acha?
Fez-se o silencio do caos!Até o ar ficou suspenso!
Silêncio total na mesa, não se ouvia nem respiração...
Todos me olharam inclusive meu marido que me olhou com os olhos arregalados...
Pensei, puxa vida, mas tudo bem, agora já disse mesmo...
Aí que alivio, meu sangue voltou ao normal...
Eu estava tranqüila.
Olhei para o “Pavão” com a maior e mais pura expressão de inocência, dei o mais lindo e falso sorriso que alguém pode dar.
Ele deve ter ficado roxo de raiva, mas não abriu a boca!
Ele não disse mais nada. A “anta” da esposa dele apenas me olhou assustada! Que me importa, estou pouco me lixando para eles. Cambada de pernósticos, vê se agora sossegam e me deixe comer em paz(comigo mesma , é claro.)!
Recebi socorro imediato, Isaura me apoiou, sorrindo e disse que também jogava na loteria, mas nunca havia acertado um numero.
Depois do raio que lancei, após alguns minutos o ambiente voltou ao normal, ou seja, descontraído(e falso).
No momento da despedida Isaura e eu trocamos números de telefone. Sinceramente gostei bastante dela a simpatia foi recíproca desde o primeiro instante.
Despedi friamente do casal “purgante”.
Aprendeu papudo! Agora ponha a viola no saco e vá cantar em outro lugar!
Ninguém ia me cutucar muito menos aqueles dois esnobes que vivem com o meu dinheiro! Palhaços!
Quando tudo terminou, meu marido queria me matar, dizendo que o “Pavão” iria mandar me prender por ter sido ofendido, que ele iria parar no “olho da rua” perderia o emprego, e outras coisinhas mais.
Confirmei minha opinião, que se danassem, mas não iria engolir a humilhação sem responder a altura, ou iria morrer sufocada com o desaforo atravessado na garganta. Quem aquele Ogro pensa que é?
Fiquei com mais raiva ainda do “Pavão” por ter provocado aquela discussão entre nós.
Comecei a rir, ao pensar se existe Pavão ogro...
Quer saber falei e está falado! Não aceito que ninguém fale naquele tom comigo, odeio ironia, acho arma de covardes de gente “frouxa”.
Depois de refletir um pouco, ele concordou comigo, achando que eu estava certa.
No dia seguinte recebi um telefonema.
Surpresa!
Era Isaura, dizendo que gostou muito de mim, que iria viajar, mas assim que voltasse marcaríamos um almoço juntamente com a mulher do “Pavão”, pois ela tinha feito muitos elogios favoráveis a mim e pretendia me telefonar. Isaura queria saber se poderia dar o numero do meu telefone para a “consorte”, não tive como negar, sim ela poderia dar...
(Será que não era para me intimidar de algum modo?).
 Nunca recebi a ligação da Ogra, ( Pavona, Pavã ou Pavão fêmea?, Pavã é mais bonito.).
Logo depois meu marido foi promovido e nos mudamos de cidade.
Ainda bem. Felizmente dessa eu escapei!
O caso ficou conhecido, todos que conheciam o Pavão gostaram da resposta que dei ao ilustre cavalheiro, pois coincidia exatamente com conceito que todos faziam dele, mas não podiam expressar, se divertiam ao lembrar do susto que o homem levou, pois ele jamais pensou que tropeçaria numa “louca” e “inconseqüente” como eu, que o afrontasse dizendo o que precisava ouvir.
Até que enfim essa fase de engolir gente exibida e fingir que não via já passou... Mulher de executivo e executiva sofre tendo que colar um sorriso no rosto e ser simpática querendo mandar muita gente para o inferno!
Isso se ela não for igual aos “Pavões” da vida, metida a rainha da cocada!Aí sim se dá bem!
Tem gente que faz questão de ser antipática para manter os outros à distancia, eu acho que sei porque...
É para evitar a possibilidade de que alguém  tire sua mascara.
Pessoas que ocupam qualquer cargo de relevância pensam que os outros subalternos ou não têm obrigação de se dobrar a sua empáfia!
Triste engano.
Humildade, simplicidade, um sorriso sincero e amigo não fazem mal a ninguém, torna a vida mais fácil, e abre muitas portas.
Mesmo que você não queira abrir porta alguma.
Sua alma agradece.
 
 
M.H.P.M.