Senhorinhas

Dizem que todo encontro guarda o inesperado dentro si. As visitas regulares ao cine cultura dão-me este inevitável prazer por vezes. Costumeiramente, com simpáticas senhorinhas. Suponho que são momentos mágicos, quando trocamos algumas palavras com as ditas pessoas estranhas. Um saudoso professor de faculdade (saudoso principalmente pelo dom da beleza e um perfume extenuante) nos dizia que um sorriso não custa nada, e como ele sorria... Aprendi esta lição e tenho utilizado-a sempre que possível, facilitando assim certas aproximações que tocam e se vão como suaves brisas.

Defino os filmes lá exibidos também como encontros que guardam o inesperado. Linguagens distintas, estórias, enredos, personagens, imagens que causam fascínio e surpresa. Quatro homens que não trocam uma palavra do começo ao fim – desnecessário se trocassem, pois se comunicam por todos os poros; uma família que ao se desmoronar renasce apoiada na franqueza das relações; uma adolescente esplêndida no seu lugar comum; uma mulher com pelos enormes nas axilas que matava porcos sem que eles sentissem dor; um pedreiro que se encanta com o violino e a professora do filho; centenas de mulheres exiladas no Iraque ou Irán?, por serem cantoras, etc, etc.

Aprecio o caminho da saída, vou andando pela varanda do prédio, vejo o palácio, as árvores frondosas e a guarda guardando a praça.

- Gostou?

- Gostei – me delicio com a pergunta “inesperada”.

- A vida é complicada né...

- É. Penso: deve ser, já que a senhora está falando e tem muito mais propriedade dela que eu.

Fiquei a perguntar-me: será que quando eu ficar velhinha, vou continuar achando a vida complicada? Esperava que os anos de velhice trouxessem a absoluta compreensão de tudo. Mas parece que não... Ou talvez seja esta a compreensão maior, vai saber.

A outra comentou:

- Barra pesada hein!?

- É. Respondi e fiquei a refletir... pelo que exatamente? pelo “nadar, nadar e morrer na praia”?

Todos não vamos morrer? Que pelo menos nademos então!

Como diz no filme: “Não tenho medo da morte, pois quando estou, ela não está, e quando ela está, já não estou”.

Lígia Martins
Enviado por Lígia Martins em 11/11/2010
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