Revisitando Ferreira Gullar
O poeta Leo Barbosa, de João Pessoa, é acusado de plagiar o poeta Ferreira Gullar no poema “Traduzir-se”. Eis as duas versões:
TRADUZIR-SE
Ferreira Gullar
Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.
Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.
Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?
TRADUZIR-SE
Leo Barbosa
Uma parte de mim
É todo mundo
Outra parte é o mundo
Profundamente meu.
Uma parte de mim
É multidão
Outra parte é sensação
De um vazio tumultuado
Uma parte de mim
É poesia
Outra parte
Um versado neutro
Uma parte de mim
É pensamento
Outra parte ponderamento
Sonho o que é ser gente
Uma parte de mim
Alimenta-se
Outra parte
Passa fome de sanidade
Uma parte de mim
É permanente
Essa outra parte
Muda-se de repente!
Traduzir-se
Uma parte
Pela outra
É uma arte
Sempre em questão.
O poema de Leo barbosa está publicado no seu livro “Versos Versáteis”, com prefácio do escritor Carlos Aranha. Leo Barbosa escreveu outro poema muito inspirado em “Canção do Exílio”, de Gonçalves Dias. O poeta paraibano Linaldo Guedes registra que seu poema “Pintura” sugeriu o trabalho intitulado “Traçando sua judez”, de Leo Barbosa.
Ferreira Gullar diz que Oswaldo Montenegro plagiou seu poema "Traduzir-se". "Metade" seria o plágio de "Traduzir-se". No frigir dos ovos, o poeta Leo Barbosa deve acreditar, como eu, que a originalidade nada mais é que uma maneira nova de dizer coisas velhas. É como já dizia o velho Salomão no Eclesiastes: “não há nada de novo sob o sol”. O problema todo é que o nosso Leo se inspira em poetas famosos. Eu, debaixo da minha humildade, só miro a criação literária de autores pouco divulgados, iguais ao meu poeta de Deus Antonio Costta, ao poeta da beira do rio Orlando Otávio, poeta biriteiro Eliel José e outros menos cotados ainda. Quando quero copiar frases, conceitos e imagens, aproveito a obra de Chiquinho do Banco, do meu compadre Erasmo Souto e de Neo Ananias, pessoas amigas que jamais irão me desautorizar ou mover processos contra o velho e desdentado Leão. Copiar servilmente obras de autores famosos é roubada, meu compadre!
Mas o plágio é diferente do “pastiche”, que é a imitação do estilo do outro. Eu, por exemplo, me esforço para imitar o jeito livre de escrever do meu compadre Tião Lucena, seus acentos pessoais, seu “tom” próprio de escrever gostoso como uma conversa na varanda, regada por umas bicadas de cana de cabeça, tirando o gosto com camarão no coco.
Ninguém nasce original. Todo grande autor começa a escrever imitando um ou vários modelos. Antonio Costta revelou que queria ser Carlos Drummond de Andrade, depois cismou em parecer com Zé da Luz, acabou tocado pelas graças do céu e passou a se inspirar em poetas evangélicos. “O Deus que habita em mim em pão e vinho,
também agora habita em arte e poesia”, declama o futuro Secretário de Cultura de Itabaiana, terra de Zé da Luz e Bastos de Andrade.
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