Em andanças pela Argentina, vi a nossa cultura!

Texto publicado no Portal Camaçari Agora: http://www.camacariagora.com.br/colunista.php?cod_colunista=17

É verdade, temos muito ainda o que melhorar em nosso país, mas, muito mais, somos uma nação abençoada por Deus, com qualidades que superam em demasia os nossos defeitos. Isso fica ainda mais claro quando observamos o Brasil de fora, além de nossas fronteiras.

Recentemente, em viajem que fiz à Argentina, tive o prazer de conhecer uma terra cheia de boas lições. Cultura, história, cidades, culinária e, principalmente, pessoas maravilhosas. No futebol, nem tanto, mas na paixão que eles têm por nossa cultura, temos muito que aprender. Sim, aprender sobre a “nossa cultura”. Foi o que você leu mesmo!

A Capoeira (nosso único esporte genuinamente brasileiro) ainda não é muito conhecida por lá, mas onde quer que ela chegue transforma o cotidiano das pessoas. Em Córdoba, segunda maior província da Argentina, por exemplo, pude comprovar a paixão que os capoeiristas hermanos devotam por nossa arte-luta, e isso não se restringe apenas às rodas, transcende as vidas particulares de cada um. Não basta a prática, é preciso conhecer tudo, e ai temos um poderoso “pacote canarinho”, que nenhum agente governamental, nem agência de turismo consegue vender melhor. É preciso conhecer a língua, pois as aulas, as músicas, a didática são transmitidas em português, é preciso conhecer a história brasileira, mas não aquela branquela que lemos nos nossos livros de história e sim a negra, das senzalas, dos guetos, dos becos da Bahia (verdadeira e sedutora história!), é preciso viver a malandragem e, para isso, conhecer a essência da nossa arte que só aqui, no Brasil, se encontra. Assim, sabiamente, pensam eles.

Na gíria da capoeiragem, dizemos que da mesma forma que todo muçulmano deve ir à Meca ao menos uma vez na vida, todo jogador de capoeira, seja qual for a sua nacionalidade, deve vir à Bahia. Desta forma, centenas, milhares de capoeiristas estrangeiros desembarcam em nossa terra, em busca do “dendê”. Muitas vezes isso passa despercebido por nós brasileiros, mas não para eles que transformaram o nosso jogo, numa paixão incondicional e converteram a nossa arte, numa verdadeira filosofia de vida.

O ex-ministro da cultura, Gilberto Gil, certa vez declarou que “a Capoeira é o maior produto de exportação do Brasil”. Discurso que apenas confirmou o que, nós capoeiristas, já sabíamos. Todavia, ainda estamos aguardando o reconhecimento na prática, pois quem tanto faz pela imagem da cultura brasileira, junto a outros povos, pouco recebe em recompensa.

A Capoeira é e sempre será um patrimônio cultural brasileiro, mas o seu reconhecimento e valorização esta cada vez mais sendo dada por outras nações.

Precisamos de uma revolução cultural em nosso país. Senti isso quando fui a Alta Gracia, ainda na Argentina, em visita a casa de Enesto Che Guevara. Precisamos nos voltar ao nosso passado, rever os legados culturais que os antigos mestres nos deixaram. Paradoxalmente, talvez o futuro nos aponte o passado como solução para o presente cultural.

A revolução está em curso. Os “sambas nas portas de minhas cumades” já iniciaram uma volta a essa essência cultural do nosso povo, aqui em nossa Camaçari. Não esqueçamos, todavia, que todos nós temos um papel fundamental nessa cena. Não se forma público de cima para baixo. O gosto pela cultura, arte, história do nosso país deve ser incentivado na base escolar e familiar.

Neste ponto, aprendi muito com os hermanos, pois lá vi adolescentes nos pátios escolares discutindo livremente sobre história da América. Vi jovens pararem as escolas, mas não para apenas terem dias de folga e sim para irem para frente do parlamento, fazer protesto contra a falta de investimento em infraestrutura nas escolas e contra a queda na qualidade do ensino (coisa, infelizmente, inimaginável em nosso país!). Enfim, é tanto o gosto pela arte por lá, que eles conseguem adotar a nossa arte brasileira, sem a rivalidade própria do futebol.

Uma amiga minha, há alguns dias me disse que eu não mudaria o mundo com minhas idéias e ações. Eu apenas respondi que não tenho pretensão de mudar o mundo, mas a cada ação, a cada texto escrito e discurso proferido, tenho a possibilidade de mudar vários mundos, pois cada ser humano é um mundo. A mudança começa assim, um mundo de cada vez.

Termino esse artigo, com um pensamento do “Che”, que me fez refletir muito sobre o meu papel dentro da comunidade e espero que possa trazer a mesma reflexão em você, meu leitor: “Sonha e serás livre de espírito... luta e serás livre na vida”.

Salve,

Caio Marcel Simões Souza

(Professor Crente)

é Administrador de Empresas, formado pela Faculdade Metropolitana de Camaçari. É Professor de Capoeira Regional, pelo Grupo de Capoeira Regional Porto da Barra. Atua profissionalmente como Analista Administrativo, também é professor de Curso Técnico, além escrever entusiasmado sobre as estradas da vida e desenvolver um trabalho de inclusão social, utilizando a Capoeira, na comunidade do Parque das Mangabas, em Camaçari/BA, atuando fortemente na área de cultura popular, onde quer que ela esteja.

admcaio@gmail.com