O Lápis Lilás


Antes de o ver pressenti-o. Farejei-o no ar. Era mesmo real. Não estava a delirar nem sequer a ter um sonho fantástico. Era mesmo um lápis. Mas não pensem que me excitei por um lápis vulgar, um mero objecto comum no qual podeis tropeçar ao virar de qualquer esquina. Era um requintado e Caran D’ache lilás. O seu perfume espalhava-se por toda a sala. Corri para ele como um doido. Queria senti-lo. Tocá-lo, inspeccioná-lo de uma ponta à outra. O bico fora afiado cuidadosamente. Parecia pronto a iniciar aquele desenho fantástico que só os génios conseguem criar. Explorei todo o seu comprimento até que cheguei ao extremo oposto e quase tive um colapso: estava roído!
Alguém chegara antes de mim. Examinei o estrago no intuito de descobrir pistas reveladoras da autoria do crime. Dentes incisivos. Dois. Muito grandes. Seria possível? Alguém da minha própria espécie tinha sido capaz de um acto tão aviltante? Foram, no entanto, poucos os segundos dedicados à resolução daquele problema. O que interessava agora era salvá-lo o quanto antes. Peguei-lhe com um misto de delicadeza e determinação e transportei-o o mais depressa que pude para os meus aposentos.
No interior da toca, a minha companheira e os miudos aguardavam-me com ansiedade.
- Eis o jantar: lápis lilás! Está roído, malta. Mas ainda se aproveita todo.
- És o melhor rato do mundo, querido!
-Viva, viva o papá!
AnaMarques
Enviado por AnaMarques em 10/11/2010
Código do texto: T2607548
Classificação de conteúdo: seguro