((__CONFISSÃO II__))


Acho graça quando vejo que para alguns sou insensível. Eu que transbordo em palavras e quase nunca falo. Eu que sou capaz de chorar compulsivamente com uma música. Eu que já achei sentir "errado" e me certifiquei que não existe erro, são só caminhos diferentes.
Duas vezes precisei não sentir nada para acreditar que poderia voltar um dia. Por duas vezes fechei a porta atrás de mim, me coloquei diante das provas que eu mesma criava para notar que uma lembrança já não me doeria mais. Assistir "antes do amanhecer" ou ouvir uma especifica música, sem nada disso me afetar. Abraçar alguém que um dia já foi tanto e não me importar com o cheiro que fica em mim.
Outra vez tive que reconstruir mais. A pouca autoestima de uma menina-mulher que já sabia: estava fadada a viver para dentro. Me fechei mais, me matei mais. Mas, hoje do tanto, sobrou nada que já não consigo transformar em palavras.
Realmente, tenho uma queda por pequenas aventuras impossíveis. Talvez ame o que não conheço, já que conhecer pode trazer junto uma série de outras coisas. Talvez ame pelo simples fato de não banalizar o sentimento, a palavra, o momento. Gosto intensamente, gosto sem dúvida, gosto sem pesar. Gosto e não quero o desgosto de não ter mais. E, para não correr esse risco, já me arrisco nas incertezas que não consigo controlar. E por fim me dedico ao trabalho, me escondo nos livros, crio uma relação sutil com a música, visito minha imaginação todos os dias. Vou vivendo uma vida inteira sentindo ao contrário, com uma grande desconfiança nas pessoas e sempre atenta ao fato que preciso viver disposta a não querer mais...sem expectativas no aliás, sem esperar por outrem as coisas que não existem mais.

Fernanda Mothé Pipas
Enviado por Fernanda Mothé Pipas em 09/11/2010
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