Objetos de fundo
Tenho temor aos raios com a luz petrificada dos trovões. Seu corpo de açúcar e a sua delicadeza de papel morreriam com a água da chuva. Na sala ela tremia ouvindo o piano tocado pela borrasca. Quando tudo se acalmava, a calma fabricava um rastro de sombra, a primeira aurora do pensamento. A sombra que adulava até os versos sobre as esplendidas noções de tempo.
Sua voz de vento soprava ao velho ritmo das letras se desfazendo na areia branca de sal. Insetos de coloração festiva lembravam o arroio translúcido do verão. Apenas no inverno deslizava o aguaceiro pelos vidros num manancial lenitivo onde tudo quer descansar protegido pela ocasião instável. Treme a vida taciturna dentro da ventania translúcida e transparente com o peso das recordações mais vivas da saudade. A chuva das palavras, essas que guardamos para entreolhar sem querer dizer nada, desenhava ternura em seu retrato.
Longe se ouve apenas o gemido abstraído da felicidade como se fosse antes de tudo alguma planta desconhecida sem raízes e eternizada no musgo da imensidão.
Logo amanhecerá em branco e vermelho. Os perdidos restarão tranquilizados entre a esperança nupcial e a fascinante aurora.