Antes da chuva

Meus pés na areia. Uma brisa pedindo docemente para eu fechar os olhos. Meu calmo assentimento e minhas pálpebras trêmulas, se aquietando gradativamente sobre meus olhos. Vai chover em alguns minutos, alguma dessas chuvas mal sintonizadas e frias de Novembro... Respiro. Há no ar aquele gosto de esperança - aquela louca e repentina proximidade entre eu e meus sonhos antigos.

Eu poderia ficar assim pra sempre: descalça, descuidada e embevecida de ilusões sobre o futuro!

Mas o mundo além das minhas pálpebras exige mais. Exige um par de sapatos, olhares baixos e desconfiados e um realismo entediante. No momento - afundo mais um pouco meus pés na areia - não me importo com esse mundo. Tenho junto ao peito, talvez meu mais bobo sonho, que é o de me livrar de tudo isso um dia. Pra ser simples e descalça pra sempre, sobre a areia de alguma praia, quem sabe. Com alguém caminhando descalço ao meu lado...

Deve haver um mundo parecido com esse que sonho, algum lugar onde eu me encaixe, onde eu não seja uma estrangeira. Algum lugar onde seja duradoura essa calma que sinto, enquanto espero essa chuva, tão certa! Enquanto me abstenho da triste vaidade humana de falar, e apenas ouço essa verdade que há dentro de mim, e que torna novo o olhar que lanço sobre as mesmas pálidas coisas.

E que chova! Estou pronta pra me molhar outra vez...