Milagre
Ruim como a peste. Ele mesmo não sabia a causa, fora educado com carinho.
Pensava na desgraça que o acompanhava, desde muito moço, embora velho não fosse, enquanto tomava uma média num balcão de um bar mal frequentado.
Não conhecia o que era uma boa amizade, o amor de uma mulher. É evidente que estes fatos incomodam. Ele tinha noção da sua maldade com os outros e consigo mesmo. Doido? Talvez fosse.
Acabada a média com pão e muita manteiga, refeição primeira, ia para o trabalho, uma famosa fábrica de tintas. Não fizera uma amizade sequer, em quatro anos de serviço. Conhecia, cumprimentava e basta.
Ainda no balcão terminando o café da manhã, sentiu-se pela não se sabe qual vez, sozinho e afastado do mundo. Nem sempre fora assim. Talvez o serviço militar, em força especial, houvesse transformado aquele homem que um dia foi obrigado a matar um cidadão. Estava de guarda, e um homem negou-se a parar e passar pelo meio da rua, em frente ao quartel onde ele servia. Era um inocente; verificou-se depois que bebia horrores, e estava muito alcoolizado quando do tiro.
Não se tornou um marginal ninguém sabe a causa, nem ele mesmo.
Pagou a conta e foi para a parada do ônibus que o levaria ao trabalho. Deu poucos passos na calçada e ouviu uma gritaria de gente que olhava para cima.
Instintivamente, fez a mesma coisa. Uma pessoa estava caindo de um prédio, e seria em cima dele, estava próxima.
Sua primeira reação foi esquivar-se. Nem ele mesmo sabe o motivo. Era uma criança, que havia caído por uma destas fatalidades que ninguém explica. Como se fosse um goleiro de futebol retesou os músculos, postou-se firme e aparou a menina que logo abriu um descomunal berreiro.
Correram todos. A menina só chorava, e levada para um hospital, constatou-se não haver fratura ou rompimento de órgão interno.
Um herói!
Hoje ele é um dos mais solicitados diretores da creche do seu trabalho, que o desviou para lá de imediato. A pirralhada adora o ‘tio’. Ele, retribui com carinho.
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