"ASA DA PALAVRA" - SEM EXPLICAÇÃO

Sempre achei que poesia não se explica. Sente-se ou não.

Na escola, quando os professores de Literatura começavam a fazer aulas de anatomia com os poemas de Bandeira, de Drummond ou de Pessoa, achava que aquilo não podia estar certo. Pra que analisar as construções literárias desses poetas? Por acaso, pra se ver a beleza de um projeto arquitetônico é preciso entender os cálculos matemáticos que o tornaram possível? Em poesia,pior ainda, o que torna possível a arquitetura do verso é o sentimento, o sentido estético pessoal e único de cada poeta, o prazer estético da própria construção. Não há como analisar ou pesar tal coisa. Eu era garota quando pensava assim. E continuo achando a mesma coisa. Li um poema de Cecília Meirelles, na 4ª série - não lembro qual - mas lembro o susto que aquelas palavras me causaram, o deslumbramento. Na aula seguinte, a professora analisou detalhadamente o poema e ele perdeu totalmente a graça pra mim. Depois da "dissecação", tornou-se um amontoado de pele e ossos sem sentido.

A ponto de hoje eu nem lembrar mais qual foi.

Do mesmo mal sofrem os pintores. Querem, a todo custo, principalmente os críticos, encontrar explicações para o que faz o artista. Lembro de uma entrevista com um pintor pernambucano, em que a repórter, diante de uma tela desse artista, perguntou o que ele quis dizer com seu quadro. O pintor olhou pra ela, perplexo. E deu a única resposta possível: "se eu quisesse me expressar com palavras, seria escritor!"

Por isso, quando se lê poesia, é preciso entender apenas que alguns poetas usam as palavras no seu estado bruto, comum, e outros (os meus favoritos ) preferem transfigurá-las, dar-lhes sentidos que nem suspeitávamos que fossem possíveis. Assim se descobre uma dimensão nova para palavras conhecidas, novos significados, dessa vez, mágicos.

Cliz Monteiro
Enviado por Cliz Monteiro em 24/10/2010
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