Terror no Home-Theater
- Filme de terror?
- Tem medo?
- Tenho raiva!
- Do quê, amor?
- Da burrice desse povo...
- Burrice?
- Isso! Olha só: um casal e seu filhinho lindo vão morar numa casa nova. Qual a lógica? Um lugar claro, fresco, perto da escola, com vizinhos da idade do moleque...
- Argh! Isso é comédia romântica.
- Muito mais verossímel! Porque, no filme de terror, eles vão morar numa casa velha, escura, abafada, lá onde Lúcifer trocou as asas por chifres.
- Lúcifer era corno?
- Era... E você vai virar também, se ficar me interrompendo com pergunta besta.
- Tá, sua grossa! Continua.
- Pois é. Daí, o moleque começa a ver coisas, bonecos falantes, amiguinhos imaginários essas coisas que as crianças fazem e que os pais acham a coisa mais lindinha, fofolete e cuti-cuti do mundo, até que cheguem à conclusão de que ele precisa mesmo é de um psicólogo.
- Ei! Eu tive um amiguinho imaginário!
- Teve? Hummm! Isso explica muita coisa.
- Hein?
- “Xá pra lá”. Voltando ao filme... Daí, o amiguinho imaginário se transforma num inimiguinho não imaginário e começa a perseguir a família toda.
- Isso, quando não é um que acaba possuído...
- ... e começa a perseguir a família toda!
- Putz! Verdade! É muito clichê.
- Aí, eles vão atrás da razão do problema e descobrem que é algum carma do passado.
- Então, pedem ajuda a um padre ou feiticeiro...
- ... que acaba morrendo na briga.
- Mas, olha só... Eu não tô te chamando para ver um filme de assombração. É um filme de serial killer...
- Pior ainda!
- Sério?
- Não! Não tem nada sério um roteiro desses!!
- Prova!
- Vamos lá... são uns cinco universitários que resolvem pegar uma estrada deserta?
- São...
- Uma loira gostosa, que deve ser líder de torcida, o namorado dela, jogador de futebol americano, um outro casal que deve ser negro ou “chicano”....
- ... portoriquenhos...
- ... e um gordinho chato pra caramba que vai ficar fazendo piada idiota o tempo todo...
- Putz! Você já viu o filme?
- Nem sei qual é, mas é sempre a mesma coisa!
- Quero ver! Você só adivinhou o comecinho...
- Tá. O carro deles quebra e eles têm que acampar no meio de uma mata onde nem o Tarzã entraria sozinho.
- Essa foi fácil.
- O gordinho continua enchendo o saco e os outros “mandam ele” buscar lenha. Daí, babau. É o primeiro a morrer.
- É vero! Mas... dá até alívio! O cara é mesmo muito chato!
- Quando o cara não volta, o que os gênios fazem?
- Mandam um atrás.
- E esse só não morre também, porque tem que voltar para contar como o outro morreu.
- Pô! Mais tá aí uma coisa que é legal!
- O quê?
- O assassino é o gêmeo mal do Super-Men! Ele deixa o morto em cada posição!
- Tem umas que são iogues!
- E é em cada lugar! Até em cima de árvore, eu já vi!
- Ah! Mas essa coisa de desafiar a física faz parte! O assassino anda como se arrastasse uma bola de chumbo amarrada na perna, mas sempre pega o jogador de futebol que está fugindo dele, correndo como se fosse fazer um touchdown.
- Eu aproveito para ir ao banheiro na hora que o maníaco persegue a mocinha.
- Por quê?
- Para proteger meus ouvidos. Já reparou como elas gritam?
- Achei que era por causa do tropeção...
- Tem isso também! A mulher pode estar fugindo do cara no piso de granito de um salão de baile, ela vai arrumar alguma coisa em que tropeçar.
- E os carros que não pegam?
- Ah! Mas só não pegam se não for o casal branco. Se for, pegam no último segundo.
- Agora, o mais difícil de entender é que, quando o assassino vai atrás deles, o que é que os imbecis fazem?
- Entram em algum buraco sem saída! Mas isso eu sei por que é.
- Sabe? Por quê?
- E pra garantir o confronto final!
- Que final? Tá doido? Esses filmes nunca acabam.
- Claro que acabam! Têm lá o final feliz, todo mundo que não morreu, respira aliviado...
- Mas fica o maior clima de “to be continued” no ar. Devia ser proibido, né? Se o original já é uma joça...
- Estou impressionado. Para alguém que não curte terror, você conhece bem os roteiros. É porque “viu um, viu todos”?
- É porque eu não perco um! Bota logo esse DVD aí!
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Texto escrito para o 6° Desafio Literário da Câmara dos Deputados - Etapa 4.
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