Lua, minha eterna musa!
Lua, minha eterna musa!
Momentos assim me fazem crer que sou privilegiada, abençoada por Deus, por ter a felicidade de olhar para o céu e ver aquele disco prateado desfilando lentamente, numa tranqüilidade sem igual. Há quanto tempo!
Era ainda criança e já me sentia fascinada por essa obra divina. Não estou falando de objeto não identificado que voa pelo espaço e escolhe lugares ermos para aparecer. Refiro-me ao nosso satélite e comparo-o a uma bolinha que os anjos abandonam depois de brincar. Agora mesmo, ela rolou e se escondeu por trás de um floco de nuvem, fazendo charminho. Não adianta esse comportamento infantil, pois estou de olho em todos os seus movimentos. Não uso nenhum objeto de longo alcance para observá-la. É assim, de longe, que se me parece maravilhosa, mais divina e fala com mais sutileza ao meu coração.
Às vezes fico a pensar, como resistirá o coração de um poeta nativo de Júpiter, diante de onze luas! Haja coração! Acredito, porém, que nenhuma delas suplanta em beleza e suavidade, a nossa lua. A minha lua que vem abençoando com fluidos prateados e benéficos, toda a minha vida, tornando-me esta pessoa amante da poesia e eternamente grata ao Criador do Universo, por tão magnífico trabalho.
Sendo musa inspiradora, a Lua despertou no coração dos poetas e escritores brasileiros, modelos de feminilidade ( herança genética que nos foi deixada por nossa Língua-Mãe, o Latim), sempre enaltecendo-lhe a pureza virginal, dadas a distância e solidão que a mantinham intocável: Rainha da Noite, Deusa, musa, por exemplo. Dela, somente se sentia o toque mágico do luar, a acariciar com mãos de arminho os corações apaixonados, que dedilhavam canções de amor, em serenatas. O luar que beija o mar e chama as sereias; que branqueia a terra e abençoa os ventos. O luar que me faz sonhar e me leva aos recônditos do passado, num turbilhão de lembranças e saudades. O luar perfumado de rosas e jasmins das pracinhas da minha cidade. O luar da calçada da minha casa, onde fazíamos serestas ao som de um acordeão e de um violão. O luar que prateia a serra majestosa, moldura de minha terra querida, paisagem que encantou meus olhos desde criança.
Que sentimento o nosso astro terá despertado no coração dos menestréis, em cujo idioma pertence ao gênero masculino? Na “Sonata ao Luar” de Beethoven, por exemplo.
Uma das atribuições mais femininas em que a imagem da Lua tomou forma palpável de mulher, foi inspiração do grande compositor e cantor nordestino Luís Gonzaga que desejou beijá-la, planejando para isso, colocar uma escada até o céu. Estando a bela musa casada com São Jorge _ um nordestino grosseiro, sisudo, montado num jumento, o apaixonado cantor não pôde realizar o seu intento, sufocando no peito o desejo que deu origem a uma das mais lindas criações musicais do seu repertório e da música popular brasileira.
Quando a Lua passa radiante, às vezes magrinha, outras vezes rechonchuda, brincando sobre as almofadas de nuvens, representa-me a filha que não tive, que sempre desejei ver pulando sobre os travesseiros da minha cama, numa algazarra feliz. Quando desfila etérea, arrastando o lindo véu, com a estrelinha piscando ao seu lado, chegam ao meu pensamento estórias de fadas que minha tia contava, às vezes ao clarão do luar, em que a Lua, na minha imaginação, tomava a forma da mais linda das fadas.
Depois que os avanços tecnológicos ultrapassaram os limites do espaço, a humanidade passou a ver a Lua sob outro prisma: astro cheio de crateras e de montanhas, sem ar, sem água, sem flores, sem brilho.
Somente o coração puro de uma criança que ainda não foi contaminado pelo progresso, sensibiliza-se ante a beleza da Rainha da Noite. Assim fez meu neto Itzack, de dois anos, ao olhar para o céu numa linda noite de luar: “Lua! Linda! Ô saudade!...”
Fiquei pasma diante do que ouvi. Meus olhos se encheram de lágrimas.
Sob o cortinado do luar, ficam claros os meus pensamentos, puros os meus sentimentos, numa profusão de saudades, ternura e desejos, ultrapassando os limites da distância, indo perder-se nos travesseiros fofos das nuvens, numa longa espera!
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Maria de Jesus. Fortaleza, 21/10/2010