AMELIE POULAIN
O filme "Le fabuleux destin d'Amélie Poulain" conta a história de Amélie, uma menina que cresceu isolada das outras crianças. Isso, porque seu pai achava que Amélie possuia uma anomalia no coração. Já que este batia muito rápido durante os exames mensais que o pai fazia na menina. Na verdade, Amélie ficava nervosa com este raro contato físico com o pai. Por isso, e somente por isso, seu coração batia mais rápido que o normal. Então seu pais, temendo pela saúde de Amelie, privaram a filha de freqüentar escola e ter contato com outras crianças. Foi sua mãe, que era professora, quem a alfabetizou até falecer quando Amélie ainda era menina.
Sua infância solitária e a morte prematura de sua mãe, influenciaram fortemente o desenvolvimento de Amélie e a forma como ela se relacionava com as pessoas e com o mundo, depois de adulta.
Após sua maioridade, mudou-se do subúrbio para o bairro parisiense de Montmartre, onde começou a trabalhar como garçonete. Certo dia, ela encontra no banheiro de seu apartamento, uma caixinha com brinquedos e figurinhas pertencentes ao antigo morador. E decide procurá-lo e entregar anonimamente o que havia encontrado e que a ele pertencia.
Ao notar a felicidade daquele homem represendada pelas lágrimas de alegria que ele deixou rolar ao reaver o seu objeto. Amelie fica impressionada e remodela sua visão do mundo.
A partir de então, ela se engaja na realização de pequenos gestos, a fim de ajudar e tornar mais felizes as pessoas ao seu redor. E assim, ela encontra um sentido para sua existência.
Durante uma destas pequenas grandes ações, ela encontra um homem por quem se apaixona à primeira vista. E então, o seu destino muda para sempre…
Hoje quando eu fiz a postagem anterior, ouvi a "Valse d'Amelie" e me lembrei de um amigo querido, de quem não tenho notícias a muito tempo.
Christian, um rapaz triste que na época em que o conheci. Lutava contra a depressão, assombrado por um mundo de drogas que apesar de já haver se libertado, fantasmas ainda rondavam o seu jardim vez por outra, quando a depressão batia a sua porta.
Passamos horas e horas durante meses conversando pela Internet. Durante as nossas conversas, ele apesar de certo ar melancólico, sorria, sonhava, brincava... Falávamos sobre diversas coisas: música, arte, ideologias ou simplesmente "abobrinhas" semeadas, cultivadas e colhidas com muito carinho. E naqueles momentos em que conversávamos ele parecia feliz e creio que realmente era. Tanto que eu até me esquecia se tratar de uma pessoa tão atordoada.
Certo dia, eu contei ao Chris uma passagem que aconteceu comigo e que agora vou contar aqui também...
"Eu estava passando por uma fase muito difícil, meu casamento tinha acabado. Do meu lar só restavam escombros que abrigavam precáriamente a mim e as minhas filhas. Eu convivia diariamente com uma dor na alma que me tirava a alegria. Alegria essa, que às vezes eu fingia sentir para o bem das meninas. E somada a essa tristeza, aliavam-se a preocupação e a responsabilidade de rescontruir um novo ninho com nada além de coragem e da fé postas sobre as minhas mãos e que eu agarrava como um náufrago a um pedaço de madeira.
E assim pesarosa, eu fazia o mesmo caminho todos os dias... Passava pela padaria, pelo mercado e parava na banca de revistas para comprar o jornal. Nessa banca sempre estava uma jovem que eu nunca me lembro de ver sorrir. E nem sei se falava, acho que só acenava com a cabeça. Mas eu, envolta nos meu problemas, nem prestava muita atenção naquela figura.
Um dia eu nem sei porque, olhei bem dentro dos olhos daquela moça e me surpreendi com o que eu vi. Eu vi dor... E a dor que eu vi, me comoveu. Então sorri para ela o melhor sorriso que podia sorrir e perguntei:
- O que aconteceu, você está triste?
Naquele momento nossos olhares se cruzaram. E por um segundo os olhos da moça esboçaram um sorriso, que foi acompanhado timidamente pelos seus lábios e ela respondeu a minha pergunta, com um gesto conformado de cabeça e ombros. Então eu continuei:
- Seja lá o que for não fica assim. Com o tempo o alívio chega e tudo se acerta.
Ela deixou que o sorriso contido finalmente aflorasse adornando seus lábios e com eles assim coloridos me respondeu:
- Muito obrigada querida, bom dia!
Respondi:
- Bom dia e fica com Deus!
A partir daquele dia, sempre que eu passava ela me cumprimentava com um belo sorriso e um aceno de mãos.
Só que em um daqueles dias eu estava tão triste, tão pesarosa que meu coração chorava por dentro. E ao passar pela banca de revistas não parei e nem ao menos olhei ou me lembrei daquela jovem. Então, quando eu já estava há alguns metros de distância, em meio a pequena multidão de pessoas que passavam por ali. Ouvi uma voz carinhosa e amiga chamando por mim quase aos gritos... Ei! Parei e olhei para trás. Era ela, acenando e sorrindo à me dizer:
_ Oi ! Bom Dia Querida!!
A tristeza que estava me dominando, se assustou tanto com aquele carinho, que se afastou de mim. E assim, a partir daquele instante, o dia ganhou nova energia e virou, pra mim, um bom dia."
Quando eu terminei de contar para o Chris essa história, ele deu um sorriso de admiração e me disse assim:
- Nara, você é Amelie Poulain!
Foi a primeira vez que ouvi falar nesse filme. Pouco tempo depois , como Chris me orientou, eu assisti. Que lindo! Recomendo
a quem puder, assistir também.
Bom,a vida seguiu...
A moça da banca de revista não trabalha mais lá. Sua mãe me contou, que ela perdeu a visão por conta de uma sequela de uma turbeculose que teve há algum tempo. Esse era o motivo da sua tristeza. A aproximação lenta da cegueira. Ainda falo com ela às vezes por telefone.
Christian, entrou em crise depressiva. Ele ainda me ligou uma vez muito mal. Disse que estava perambulando sujo pelas ruas e lembrou de mim. Conversamos por algum tempo naquela noite, tentei reconfortá-lo, dar-lhe força. Ele prometeu ligar no dia seguinte mas, nunca mais ligou. Eu tentei entrar em contato. Mas seu telefone foi desligado. Chris sumiu como folha levada pelo vento... Espero que ele esteja bem, onde quer que ele esteja.
Nem sempre as histórias tem o final que desejamos. Mas o bem que vivemos no desenrolar das histórias da nossa vida, fica pra sempre.
Mesmo não tendo terminado da forma que eu queria, a moça da banca de revistas e o Christian, fazem parte das minhas doces memórias...