Escrever é Não se Deixar Morrer.

Não sei porque os poetas malditos sempre travam em alguns momentos.

Ficam parte de suas vidas criando suas loucuras; em outra parte ficam “curtindo” a loucura produzida. É normalmente nessa hora que travam, que não conseguem fazer mais nada a não ser prostrarem-se dentro de si mesmo.

Mas uma coisa passa na cabeça de um poeta maldito numa hora dessas, e foi o que me confidenciou, trêmulo, Baudelaire, numa tarde em Paris; bebíamos vinho, e ele me disse baixinho:

“Savok, jamais deixe de escrever, mesmo que teus dedos caiam!”.

Depois disso, nunca mais deixei de escrever. Escrevo sob quaisquer circunstâncias e sobre quaisquer situações. Minha última internação, e, 1.899, quando contraí uma meningite meningocócia que me causava cócegas, muitas vezes mal conseguindo me apoiar na cama e empunhar caneta, escrevi durante uma semana, ou seja, do momento em que fiquei consciente, porque antes não falava coisa com coisa, até o momento de minha fuga, numa madrugada em que todos cochilavam pelos corredores. Saí de roupão de hospital e tomei um taxi, sem dinheiro e sem nada. Mandei parar no amigo Dom, e foi lá que dei um jeito nas coisas.

Escrever em ônibus é a mais árdua maneira de escrever. Pelo menos nunca escrevi apoiado na chapa quente de um carrinho de lanche, como fazia um poeta louco de periferia amigo meu. No ônibus tem de ser um pouco equilibrista para não criar um texto rabiscado.

Pode-se escrever em papel de pão, guardanapo, trapo velho de roupa, na parede, com sangue, pasta de dente, com o jorro da urina, na rua quente... etc, etc.

Paulo Coelho, por exemplo, gosta de ir para um apartamento seu no Rio de Janeiro para ter inspiração. O cara é uma piração. Está de zoação, não é possível. E desde quando tem de se ter um local específico para se ter uma inspiração?

O que vale mesmo é a imaginação, não importa se você está numa caçada na Tanzânia ou num trem rumo a Moscou. Ajuda, mas não é imprescindível.

Imagine aonde estava Joseph Conrad quando escrevia Coração das Trevas.

Savok Onaitsirk, 28.10.09.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 15/10/2010
Reeditado em 15/10/2010
Código do texto: T2557798
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