FETICHE

Aos 10 anos, quando minha irmã mais velha já tinha 20, eu tinha verdadeiro horror de me imaginar usando os sapatos à moda Luiz XV, como ela usava. Graças a Deus, quando tive idade para usá-los, eles já estavam com o saltos mais baixos e mais grossos também.

Hoje, no entanto, parece que a moda voltou e as pobres mulheres, para se sentirem mais poderosas e sedutoras, voltam a fazer esse sacrifício. Eu reluto e fico a observar algumas que andam curvadas, se equilibrando naqueles saltos finos que entram nas pedras portuguesas e, muitas vezes, as fazem cair no chão ou dar um passo à frente enquanto o sapato fica preso nas pedrinhas.

As mulheres poderosas da política deveriam andar a pé, pelo menos uma vez na nossa cidade, para saberem o estado em que se encontram as ruas do Rio de Janeiro.

As pedras portuguesas são muito bonitinhas, mas pouco práticas. Estão sempre se soltando, já que não são acimentadas e sim presas com terra. Já cansei de ver trabalhadores recolocando-as. É claro que numa cidade grande, é difícil mantê-las todas nos devidos lugares.

O mundo mudou, evoluiu, tem gente demais e as calçadas deveriam ser feitas de uma maneira mais inteligente e prática. Que as calçadas de Copacabana, que são conhecidas pelos cartões postais, continuassem com o seu desenho de pedrinhas brancas e pretas, é admissível, mas as calçadas das ruas fora da orla, não.

As árvores, com suas raízes poderosas, suspendem as calçadas e as pedras se soltam. Nos dias de chuva se formam poças d’água, verdadeiros piscinões.

Creio que todos concordariam com essa minha sugestão, menos os ortopedistas que passariam a atender a muito menos pacientes.

Os sapatos femininos são um fetiche para as mulheres e especialmente para os homens.

Confesso que invejo quando vejo os sapatos masculinos, com aqueles bicos bem largos, dando a impressão de que o pé fica muito bem acomodado dentro deles. Confesso, ainda, que meus pés se encolhem dentro do sapato quando vejo, na vitrine de sapatos femininos, aqueles bicos que mais parecem especiais para matar barata no cantinho da parede.