"O PRÍNCIPE" E AS ELEIÇÕES
Quando na quinta e sexta-feiras, anteriores ao dia das eleições, começaram a pipocar em minha caixa de e.mails diversos textos falando coisas ilógicas sobre alguns candidatos, eu coloquei várias pulgas atrás das orelhas e me lembrei de Nicolau Maquiavel.
Nascido em Florença, em 03 de maio de 1469, Maquiavel se notabilizou não apenas por ser historiador, poeta, diplomata e músico, mas, sobretudo, por ter escrito um livro que já mereceu interpretações em mais de três mil outros, elogiando-o ou "sentando o pau" nele: “O Príncipe”.
A história dessa obra tem de levar em consideração não apenas o contexto político da época, como também a situação em que o autor se encontrava, e é isso que eu exponho se seguir:
O livro foi escrito em 1513, portanto durante o Renascimento, numa época em que o mapa da Itália parecia uma “colcha de retalhos” (Ducado de Milão, República de Veneza, República de Florença, Reino de Nápolis, Estados Pontifícios da Igreja Católica). Em outras palavras, aquela região era formada por vários pequenos estados, cujos governantes queriam dar pernadas uns nos outros, revezando-se em intrigas diplomáticas e disputas por riquezas.
Em 1512, Maquiavel, que tinha sido II chanceler da república durante o governo do papa Alexandre VI, se danou, pois Lorenzo de Médicis tomou o poder, 18 anos após sua família ter sido expulsa de Florença por Savanarola, que por sua vez, fora deposto e morto pelo referido papa.
Suponho que tenha acontecido um negócio bem parecido com o que acontece hoje após as eleições: o grupo perdedor fica um tempão se lascando no ostracismo!
Mas voltemos à história do livro. Lorenzo foi até bonzinho com Nicolau, pois podia ter ordenado sua morte, podia ter mandado cortar-lhe os bagos..., mas condenou-o a ficar quietinho, exilado em sua propriedade, em San Caciano.
Então, tristinho, sem ter nada o que fazer, eu acho que Maquiavel resolveu “ficar bem na fita” com os governantes, pois em poucos dias ele produziu e dedicou ao seu “algoz”, Lorenzo de Médicis, uma espécie de manual, com 26 capítulos, sugerindo o que ele deveria fazer para unificar os principados e se manter no poder.
O livro mostra um autor culto, conhecedor de diversos fatos históricos, e por diversas vezes menciona os feitos de César Bórgia ( filho do papa Alexandre VI. Isso mesmo que você leu: naquela época papa podia ser casado, ter filhos, matar...), o duque Valentino, um sujeito tão “gente boa”, que no dia 31 de dezembro de 1502 foi capaz de convidar seus inimigos para uma festa em seu palácio, aprisioná-los e assassiná-los. Isso sem falar que há historiadores que juram que ele era amante de própria irmã, Lucrécia Bórgia. Preciso falar mais alguma coisa?
Muito sinteticamente, chegamos ao pano de fundo desse livrinho de 113 páginas, que, por exemplo, no capítulo XVIII intitulado: “De que modo os príncipes devem manter a fé da palavra dada” diz: “[...] um senhor prudente não pode nem deve guardar sua palavra, quando isso seja prejudicial aos seus interesses e quando desapareceram as causas que o levaram a empenhá-la. Se todos os homens fossem bons, este preceito seria mau; mas, porque são maus e não observariam a sua fé a teu respeito, não há razão para que a cumpras para com eles.”. A seguir, Maquiavel dá o seguinte conselho: “Mas é necessário saber bem disfarçar esta qualidade e ser grande simulador e dissimulador: tão simples são os homens e de tal forma cedem às necessidades presentes, que aquele que engana sempre encontrará quem se deixe enganar.”
Então, meu habitual leitor, acostumado a me ver assumindo posições políticas, eu quero lhe dizer que eu votei na Marina da Silva, e que agora vou pensar muito bem, porque eu acho que quem orquestrou o envio daquela série de e.mails na semana passada, deve conhecer “O Príncipe” de cor e salteado.