Viagem no escuro...
 
 
A complicação já começou quando marquei a passagem de avião para Belém, fiz a bobagem de estar perto de meus três filhos pequenos, mal consegui agendar a data e o vôo.
Ao menos acertei o destino final, Belém!
Dei mil beijos e mais um milhão de recomendações aos meus filhotinhos e me dirigi ao aeroporto do Galeão.
Para “variar” o transito estava horrível.
Cheguei ao aeroporto em “cima” da hora, despachei a bagagem e suspirei aliviada! Estava tudo bem.
Embarquei.
Surpresa! Gente parece que vivo de surpresas!
Embarquei no avião.
O vôo fazia escala até em lanchonete de estação ferroviária. (Não sei como isso seria possível, rs, rs...)
Para encurtar o assunto, saí de manhã e cheguei ao final da tarde ao meu destino, conheci todos os aeroportos do Rio até Belém, costeei o Brasil quase todo.
Quando finalmente desembarquei era uma verdadeira retirante, descabelada, minha roupa amassada parecia ter sido tirada de uma garrafa, “bufando” de raiva, por ser tão burra e desatenta para fazer aquele vôo.
Meu marido me esperava no aeroporto, me disse que no dia seguinte teríamos um almoço com todos que trabalhavam com ele e suas respectivas esposas. Gostei da idéia.
Fomos para o hotel, desfiz minhas malas, mandei passar a roupa que usaria no dia seguinte, separei a bolsa, sapatos e bijuterias. Arrumei todos os objetos de higiene pessoal e a maquiagem no banheiro, desde batom até colírio.
Na manhã seguinte, um sábado, estava um calorzinho gostoso, tomei café no quarto e aproveitei ficar naquela cama fofinha o máximo que pude.
Meu marido se arrumou e me avisou que me esperaria no hall, onde as pessoas se encontrariam para depois irmos almoçar, não esqueceu da  recomendação de que não me atrasasse.
Não sei por que, recomendação inútil, nunca me atrasei para nenhum compromisso!
Levantei toda feliz, depois do banho, pinguei colírio, comecei a me pentear...
Engraçado, o espelho está embaçado, mas o banho não estava quente o suficiente para fazer tanto vapor a ponto de embaçar o espelho...
Será que são os meus olhos? Deve ser de ontem, do ar frio do avião... (ÔÔÔ se foi,!)
Pinguei mais uma gotinha do colírio.
Esse espelho está me azucrinando, está ficando cada vez mais embaçado...
A esta altura dos acontecimentos quase não enxergava mais nada...
O que será que está acontecendo comigo?
Parei e pensei (coisa rara), o problema era no espelho ou nos meus olhos...
No espelho não podia ser, então...
Resolvi fazer um esforço sobre humano para ler o nome do colírio...
Meu Deus!!!!!!!!!!!
Não!!!!!!!
Só pode ser “sacanagem”!
Que inferno!
Louca, desvairada!
Que ódio!
Era o dilatador de pupila que eu tinha usado na semana anterior para fazer exame de vista, a idiota tinha pegado o colírio errado!
E agora?
O que eu faço?
Cadê meus óculos escuros?
Por sorte sabia mais ou menos onde estava o armário, os óculos deviam estar lá.
Achei o bendito óculos!
Verde de raiva penteei os cabelos quase os arrancando pela raiz e rezei para que estivesse acertado passar o batom, será que não estava com boca de palhaço?
O telefone tocou, era meu marido querendo saber por que eu estava demorando.
Pedi a ele para que viesse me buscar. Ele achou estranho, mas atendeu meu pedido.
Quase teve uma síncope quando contei o que tinha acontecido.
Acalmei o homem!
Ele que não se preocupasse, ninguém notaria se ele permanecesse ao meu lado de mãos dadas ou me dando o braço. Eu estava cega!
Sem opção, concordou.
Quando cheguei ao hall, vi muitos vultos, fui apresentada a um por um, sempre agarrada à mão ou ao braço de meu par. Sorria, estendia a mão e notava se era homem ou mulher.
Felizmente tenho boa memória auditiva. Ainda bem!
Depois das apresentações, embarcamos no carro e nos dirigimos a um restaurante a beira da baia de Guajará.
O sol do Pará é de uma claridade incrível!
O restaurante era quase todo aberto para que os fregueses desfrutassem uma vista linda da baia com seus barquinhos e canoas cheias de mercadorias navegando em direção ao mercado do Ver-o-Peso. (vi isso em outra ocasião...)
Todos foram gentis comigo, me colocaram de frente para a baia, afinal era a convidada.
Eu queria morrer! Cair dura!
O sol batia na água e refletia para dentro do restaurante, ou melhor, para dentro dos meus Olhos!
Conversei normalmente, enquanto disfarçadamente enxugava as lágrimas, informando que estava com alergia...
Os olhos doíam demais, mas aguentei firme... Ossos do ofício...
Bebi e comi, mas não sei o quê, só notei que tinha farinha, estava saboroso, bem de fome não iria morrer.
Mal enxergava o prato.
Rezava para todos os santos para que aquela tortura acabasse logo, fiz até promessa.
Quando finalmente a maioria se despediu, me senti renascer.
Durou pouco!
Quando você está se “lascando” tudo contribui para piorar a situação.
Um casal “muito gentil” resolveu me mostrar a cidade!
Não!!!!!!!!!
Não quero ver nada!
Quero me deitar e morrer sossegada!
Sim!!!!!!!! Isso mesmo,fomos...
Entramos e saímos de igrejas, ruas, avenidas, mercado, lojas.
Eu mais grudada que uma ostra no braço de meu marido, o coitado já devia estar até com câimbras, mas tinha que agüentar firme, já que se transformara em guia de cego.
Quando chegamos ao hotel eu já estava ficando histérica, injuriada,queria uma solução para aquele problema saísse de onde saísse.
Meu pobre comparsa buscou na lista telefônica algum oftalmologista de plantão.
Finalmente um filho de Deus atendeu o telefonema.
Peguei o telefone e quase chorando contei minha tragédia, implorei que me ajudasse. Ele pediu que eu fosse ao consultório, respondi que não daria nem mais um passo, estava em estado de choque. Abri a boca “no mundo”, chorei até quase derreter...
O médico concordou que meu marido fosse buscar a receita e comprasse o colírio.
Quando ele chegou parecia que o céu estava se abrindo e ele aparecia chegando numa nuvem de esperança. (acho que era cor de rosa, não vi bem...)
Meu príncipe, só faltou o cavalo... (apenas por que cavalo não anda de elevador e nem sobe escada)
Nunca fiquei tão feliz ao vê-lo como naquela hora, nem quando namorávamos. Dando risada ao ver meu desespero, ele não me deixou nem ver o vidro de colírio, ele mesmo fez questão de pingar uma gota em meus olhos. Me avisou que jogaria os dois vidros no lixo, porque eu era uma arma...
No dia seguinte eu estava novinha em folha pronta para mais um convite, fosse ele qual fosse.
Foi um jantar na casa de um casal que tinha estado conosco no sábado, estariam presente as mesmas pessoas do dia anterior.
Me arrumei bem bonitinha e fui toda feliz!
Foi quando fiquei conhecendo a todos.
Depois do jantar, estávamos reunidos numa enorme e aconchegante sala, quando me deu o famoso “um minuto” (não é os cinco minutos) minha boca que digo sempre ter vida própria, se abriu e resolveu contar o que tinha se passado.
Foi uma comédia, todos riam e não acreditavam que eu estivesse com as pupilas dilatadas e eles não notaram nada.
Deram mil palpites, deveríamos ter adiado o almoço, eu deveria ter contado e pedido sua ajuda e outras sugestões. Não adiantava nada, já tinha acontecido mesmo, mas valeu a solidariedade.
Permaneci na cidade mais um par de dias, ela é muito bonita e as pessoas agradabilíssimas, vou sentir saudades deles.
Valeu o sacrifício do vôo tão longo e o episódio do colírio. Com a passagem de um vôo direto nas mãos fui comprar lembrancinhas para todos da família, alguns doces, e uma planta em pó que me informaram no mercado Ver-o-Peso que era para retardar o envelhecimento...
Mentira!
Me enganaram, a tal planta em pó não adiantou nada...
Não retardou velhice coisa nenhuma, estou um caco...!
 
 
M.H.P.M.
 
Helena Terrível.