RUMOS POLÍTICOS. ESPERANÇA.

Saídos da virgindade retórica, das teses, para a praticidade dos Estados, as ideologias e os sistemas de governo tiveram oportunidades de se amoldarem ou se afastarem dos meios sociais que inspiraram, regraram e conduziram. Mas se estabeleceram e evoluíram ou restaram superadas.

Sistemas de governo feneceram, mostraram-se inadequados, ilusórios e frustrantes, motivadores de paixões e infelicidades coletivas. Felicidade de alguns só no sectarismo individual comprometedor de emoções e do próprio anseio inspirador do convívio. Foi assim o comunismo.

A novel sociedade do conhecimento e da informação abraçou o mundo com a volatilidade das conquistas tecnológicas. Dessa maneira viu-se a explosão de um novo exército de excluídos na guerra mundial por empregos, surgida com o capitalismo eurasiano, tornando Europa e Ásia combatentes da social-democracia.; um novo tempo, um novo estágio.

Não fora em vão que o exemplo jacobino obcecou Lênin e Trotsky, da mesma forma que a revolução russa obcecou Albert Mathiez e seus sucessores.

O vocábulo "jacobinismo" evoca mais uma tradição que um conceito de um clube cuja atuação, essencial desde o início da Revolução Francesa, tornou-se tão dominante que, nessa época, 1792/1794, e no futuro, o adjetivo "jacobino" passou a significar os partidários da ditadura da salvação pública. Não tiveram muito sucesso. Assim demonstra a história. Não existe salvação sem liberdade! Esqueceram-se os supostos "grandes cérebros".

A queda do muro de Berlim é marco da metamorfose. Figuras carismáticas como o inigualável Papa João Paulo II e Gorbachev, este através da "Perestroika", deflagraram os últimos passos da ideologia que suprimiu o maior bem, a liberdade; por isso não podia sobreviver.

Duas potências, “guerra fria”, dois caminhos ideológicos; isto findou, terminou, acabou. Passamos para melhor em que pese variadas vertentes. Mesmo na China, onde iniciou-se com Deng Xioping as reformas já em 1978.

Lamentavelmente os cérebros comunistas enveredaram para um capitalismo pior; estragaram o socialismo e estão acabando com o capitalismo. Em Cuba se notabiliza a medicina e deve haver uma razão; falta de proteína, pois para se obter um ovo necessita-se ficar na fila. É o cuidado com o efeito, agenda publicitária, símbolo marcante do opinioso.

Na antiga URSS, findo o regime, Vladimir Putin e o resto do partido ficaram com as melhores estatais privatizadas e os melhores negócios, tudo a preço vil. Qualquer capital investido nacional ou estrangeiro tem de passar pelo filtro da corrupção burocrática e deixar seu quinhão para a desenfreada roubalheira. O Poder Político se manteve controlador, sem imprensa livre e ausente de liberdade partidária. Mesmo assim rotula-se de democrático o regime.

Esse o padrão atual de transição do dito socialismo para o capitalismo. Mas existem outros dois caminhos seguidos. Na China o Partido comunista organiza a entrada do capital estrangeiro que se faz por investimentos de empresas nacionais. Inexiste democracia; há combinação de mercado livre com ditadura coletiva do partido, o que é paradoxal. Funciona, porém, integralmente, a liberdade de empreender.

O acesso à liberdade individual de empreender, ganhar dinheiro e progredir, garantindo a propriedade privada é uma realidade. Onde irá ancorar esse inusitado e misto padrão ninguém sabe, com classe média formada, acesso à educação e sujeita à sedução do mundo ocidental.

Mudou o mundo, mudaram os homens, realizaram-se empirismos, restaram resultados. O tempo, senhor da razão, deixou marcas profundas, irreversíveis, tangíveis.

Se no leste europeu em rápido passo ingressou-se da exceção à democracia, não se obteve a harmonia, logo que deflagradas terríveis e sofridas guerras étnicas. De outro passo, o Estado teológico surgiu com mais força, impulsionado pelo terrorismo e ainda vivenciado pelo sectarismo religioso, embora e felizmente, não de forma plena, mas ameaçador, trazendo convulsão mundial e novas barreiras mundiais de segurança.

A América Latina esboça ainda um forte esquema de antagonismos sob visão doutrinária em face de sistemas de governo e ideologias. No Brasil a esquerda pratica governabilidades então de direita, fortalecendo o capital antes execrado em seus objetivos pelo partido que conquistou o poder. Na Venezuela, entre bravatas de líderes populistas, nunca carismáticos como Perón ou Vargas, que realmente lançaram bases de trabalho reconhecidas pela história, acena-se com o sonho do enfrentamento das Américas; a pretensiosa miríade, que faz da massa ouvinte de longos e enfadonhos "discursos".

No Chile, sob razão e inteligência criativas, definiu-se a convenção da racionalidade, "concertación", pondo em mira que o Estado existe para o homem e não para os partidos, embora estes suplementem aquele. É a melhor e mais espaçosa mecânica estatal, pode-se dizer, em modernidade, afastados os sistemas europeus que aproximam-se da perfectibilidade como a Finlândia.

Todos os seres humanos sabem, uns por dever de ofício, outros pela representação política que se dá através de regimes plurais, sendo seu elemento essencial o sufrágio universal, voto, que está a humanidade no mesmo barco - exceção feita às tiranias - tendo a ciência do direito como definidora das normas de convívio, traçando padrões a serem observados por todos.

A sociedade é o ordenamento da convivência dos individuos, como singela e profundamente nos passa Hans Kelsen, o arquiteto do direito objetivo.

Assim, desde antes da formação da personalidade civil que se dá pelo nascimento, na passagem pela vida, que começa pela primeira inalação de oxigênio, até o desaparecimento da personalidade, que se extingue com a morte, o direito regula nossos passos.

Nessa seara, nessa caminhada espaçosa e vastíssima, inserem-se as ideologias, que movem o direito e transformam suas anterioridades ou conservam a tradição. O direito é luta, já afirmava sem oposição da posteridade, o notável romanista tedesco IHERING.

Assim, temos na história política, sejam de exceção ou não os regimes, os primeiros chegados de atos revolucionários, os segundos por vontade popular, através do voto, o direito, a legislação obrigatória para todos. Nesse ideário de criações cerebrinas e cerebrais, vieram-nos os “chavões” direita e esquerda, que de certa forma persistem.

Essa nomenclatura, contemporaneamente, deslustra a informação, desinforma quem necessita ser informado, fecha a porta à realidade. A América Latina hoje, é campo de estudo afirmatório da descaracterização unicista e restritiva desses antigos braços políticos.

Bom de dizer que o capital internacional , ainda que não totalmente inclinado para estas vertentes, está mais suscetível aos seus chamamentos. Sempre sem a total força, necessária a implementar grandes investimentos. Por vezes diante das altas taxas de corrupção, se acanha em justificado temor.

De par com esse quadro, temos o populismo de Chávez, Evo Morales e Kirchner, que ainda assim, nem de longe reprisam Perón ou Vargas, símbolos do paternalismo carismático. Essa esquerda nada contém, portanto, dos velhos propósitos da virada, tão ao gosto esquerdista propriamente dito. Situam-se no atraso puro e simples do populismo.

As esquerdas atuais se confundem com a direita, e de modo algum seriam seduzidas, novamente, para a derrocada do estado de direito. Sabem que estariam afastadas do universo indispensável da globalização econômica, celeiro energético e de insumos em geral.

Os liberalismos todos coloriram as chamadas direitas que, hoje, ficam dificeis de distinguir como perfil adotado em seus originais conceitos por redutos políticos conservadores. Não foi estranha, em direito público, a marcante presença do liberalismo nas constituições dos séculos XVIII e XIX. Sistemas de garantia das liberdades individuais e, em relação ao Estado, como eixo de coordenação e competência de poderes, cada qual agindo dentro de sua área e prerrogativas próprias, inalienáveis e intransponíveis.

Não é mais permitido nem mesmo discutir, a negativa de absoluta existência da fusão de idéias, esquerda-direita, tornando letra morta as especialidades antes radicalmente postas. Ficamos por aquí, para não abraçar, por impossivel, o gigantesco espaço que se abre em fatos e acontecimentos que todos conhecem demonstrando a colocação, apontando somente a vitoriosa conquista do Chile na “concertación democrática”, que se situa no topo do que há de mais moderno como esquerda.

Mas é preciso educação e ausência de populismo e fisiologismo para atingimento de tal estágio. Em contraposição a este desejado e desejável anfiteatro de Estado e consciência da população, espreita e se manifesta a todo instante, o “gregarismo sociológico”. Gregarismo, passando por todos os dicionaristas exemplares da lingua até o mais aplaudido na atualidade, Houaiss, “é a aglomeração de individuos da mesma espécie”.

Sociologicamente, como leciona Joaquim Pimenta em sua “Enciclopédia de Cultura Sociologia e Ciências Correlatas”, gregarismo “é a submissão automática ou cega fidelidade a uma crença, seita ou partido, obliterando a faculdade de livre exame de senso crítico, de autonomia mental”.

Essa subjugação da vontade que afasta o livre exame, origina-se no que Joaquim Pimenta rotula de ”meneurs”, os líderes seguidos cegamente na busca de propósitos que seriam válidos e que têm de ser atingidos; de qualquer forma.

Embora essas passionalidades, supunha-se, já não caibam em nossos dias, li com surpresa este ano, uma entrevista no jornal O Estado de São Paulo, de 28/05, fls. A9, dada pelo respeitadíssimo sociólogo Alain Touraine, dizendo que todos do governo atual sabiam do que ocorrera com o “mensalão” e isso foi demonstrado. Se descobriu.” É sua a opinião.

Deixa nas entrelinhas o sociólogo que se nada ocorreu em contrário, foi legítimo o fim atingido.Seriam os fins justificando os meios, escola de Maquiavel, sejam quais forem os meios, idôneos ou não.

Ao valor de absoluto contrapõe-se o de relativo. Esse pêndulo cristalizou-se nos sistemas de filosofia de Kant, criticismo, de Comte, positivismo e no evolucionismo de Spencer.

Os fins justificam os meios? Formulou Maquiavel a indagação. Pergunta-se permanentemente. Sob o enquadramento do valor pensante mais alto da dogmática, a crítica, que estuda e analisa o que se põe face ao seu exame, devolve-se a pergunta. Quais fins e através de que meios buscados?

Mas há um eixo operacional a que todos se curvam nas indagações valorativas. O mal não é necessário! A máxima, o pregão que atravessa os tempos, sem censuras, nos vem do tomismo, do venerável gênio aquiniano de São Tomás de Aquino, o filósofo dos filósofos.

Doutrinas exóticas as mais diversas, servem ou desservem os rumos do homem na história da sociedade; vestem ou desnudam vestígios de civilização, massacram por vezes esteios sacramentados na conquista da seleção natural para melhor, como nos ensinou Spencer.

Abordaremos duas dessas elaborações que se tocam pelo absurdo, ambivalentes no demérito, distantes no tempo, embora atuais, e se igualam no gregarismo, pondo de lado as conquistas que privilegiam consensos como a “consertación” do Chile.

Malthus, em período longevo, em seu famoso ensaio sobre o princípio da população, entendia que enquanto a população cresce em progressão geométrica, os meios de subsistência ( víveres) cresciam em velocidade aritmética. Criou o Malthusianismo, doutrina segundo a qual, para prevenir ou evitar as consequências fatais e inexoráveis de uma ação direta da natureza, aconselhava a que se impusesse o sacrifício ou o constrangimento moral, sobretudo, entre as classes pobres, ou antes nas classes trabalhadoras, de reduzirem ao mínimo, o mais possível, a procriação, de não aumentarem a prole, predestinada a não encontrar lugar vazio, como ele nominava “no grande banquete da natureza”. Pregava pois o extermínio dos indesejados nascimentos. Diga-se que Malthus era pastor inglês, além de economista. Sua teoria abriu sérios debates. Parecia estar antevendo os dias atuais quando tanto se fala em falta de grãos por motivos diversos, inclusive destinação energética.

Recentemente e de forma não muito velada, na China, existiram as “Casas de Exposição”, locais para onde eram levadas principalmente meninas, nascidas excedentemente aos dogmas regulamentares do Estado, relativamente aos controles populacionais.

É claro que tais fins não justificam os meios; o mal não é necessário!

O que isto tem em intimidade com o Brasil e sua atualidade?

A ausência de análise crítica por ausência de educação, muito mais quando mentes privilegiadas como a de Touraine ostentam princípios de Maquiavel, fins justificando meios reprováveis; responde-se.

Malthus e Touraine têm em suas crenças, umas mais subjetivas que outras, embora ambas busquem objetividades, o anátema, o estigma, a marca e o sabor féleo ( amargo) da ausência de ética, e formam o gregarismo; formam e formaram súditos, discipulos.

Prefiro ficar com São Tomás, sou tomista por formação. O mal não é necessário.

A fusão de idéias onde o melhor para a humanidade deve prevalecer, seja qual for a coloração ou inclinação política, é o grande norte a ser alcançado.

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 06/10/2010
Reeditado em 08/10/2010
Código do texto: T2541154
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.